quinta-feira, 21 de maio de 2009

INTITULADO -- PT. 10

A ambulância levou cerca de sete minutos para chegar. A polícia chegou em cinco minutos. Duas viaturas estacionaram em frente á casa de Rafael. Os seis policiais subiram ao quarto e abriram o inquérito. Três para-médicos subiram levando a maca consigo. Um deles levava também um avental, que foi usado para cobrir Rafael. A maca foi armada próxima á cama. Os médicos fizeram um curativo para tentar minimizar o sangramento, mas já constataram que seria necessário o uso de pontos cirúrgicos, radiografia e exames. Dois dos policiais ficaram no quarto, interrogando Natasha e Thaís. Perguntavam sobre como foram chamadas, quanto foram pagas pelo serviço, o que faziam quando Rafael se acidentou, e enfatizaram a questão se sabiam que Rafael era menor. Ele ainda tinha dezessete anos, só completaria dezoito dali a sete meses. As duas foram levadas para a delegacia, fichadas e presas por prostituição e aliciamento de menores. Nenhuma tinha dinheiro suficiente para pagar um advogado. Teriam de contar com a sorte de seu indicado ser alguém de competência e digno de alguma confiança.

Os outros policiais investigavam as dependências da casa de Rafael. O local da pista, bar, sala de estar, a sala de televisão toda equipada com equipamento de projeção e home-theater, o extenso hall de entrada, piso de mármore e tapete persa, trazido pela mãe de Rafael, numa viagem a negócios.

Dentre os convidados da festa, dois eram menores. De fato, eram duas meninas, que Gabriel tinha convidado. Dois rapazes serviram bebida a elas uma hora antes da polícia chegar. As bebidas eram misturadas, e as duas não haviam comido nada. Os quatro foram levados à delegacia. Os pais das duas meninas tiveram de ser acordados e notificados que teriam que ir buscar suas filhas na delegacia e assinar alguns papéis. O pai de uma delas, disse que chamaria um advogado para processar os rapazes e Rafael. Perguntava sem parar sobre os detalhes da festa, aonde era e o quanto sua filha havia bebido. Os fatos em nada condiziam com a versão dada pela filha antes da festa. Ela disse que iria estudar na casa da amiga para um exame de física que ocorreria na semana seguinte. Apesar da suspeita, os pais concederam e deram dinheiro para a filha chamar um táxi.

O advogado seria chamado ás dez da manhã do domingo. Algumas desculpas pela hora da ligação, uma breve introdução do assunto e medidas legais a serem tomadas. Isso ocuparia boa parte do domingo e da semana . Para a filha, nada de sair pelo próximo trimestre. Internet em casa apenas para trabalhos escolares. O Orkut teria de esperar noventa dias.

Rafael estava tendo a cabeça examinada ás três da manhã, pela equipe de plantão. A radiografia mostrou uma concussão na parte de trás do cérebro. Um vaso estourou e o sangue vazou para o cérebro. A cirurgia seria feita para retirar o sangue e estancar.

A polícia já havia terminado o inquérito na casa de Rafael. Todas as pessoas que trabalhavam na casa foram dispensadas, a casa foi revistada, mas apenas foram encontradas as bebidas da festa, e, com exceção das duas meninas, todos na festa tinham mais de 18 anos. Gabriel completava no mês anterior. Bruno já era maior de idade há 5 meses.

Um detetive da polícia foi chamado para avisar os pais de Rafael, assim que chegassem na manhã de domingo.

A escola amanheceu sob uma chuva fraca e um vento a noroeste, que umedeciam os portões da escola, fazendo todos os alunos recorrerem a casacos, gorros, luvas e cachecóis. A temperatura não passou dos 16 graus o dia todo. Gabriel chegou sozinho à escola. Passara boa parte da noite respondendo ao questionário dos seus pais, em especial, da sua mãe, sobre o que ocorrera na festa. A menina que foi levada a delegacia nada tinha a ver com ele, mas ainda assim seu pai se enfurecia pelo fato. Alguns dias depois do delegado se inquietar, ele volta a ser atenção da polícia. Depois de um habitual sermão, Gabriel vestiu um casaco que seu pai trouxera de Nova Orleans, e foi à escola.

A chuva não o incomodava. Já tinha muita coisa na cabeça a pensar, que uma simples toalha não fosse capaz de arrumar tudo. Passou pelo portão ás sete e dez. Foi direto pra sala. Não costumava cumprimentar ninguém, exceto Bruno e Rafael.

Johnny chegou ás sete e quinze. Encontrou Laysa na cantina. Ela tomava um café com alguns muffins, ouvindo Oasis no mp3. Ao ver Johnny, ela se levantou e ofereceu o café. Johnny recusou, mas comprou um no balcão.

- Como vão as coisas?! - Johnny quebra o silêncio.
- Acho que tô bem. Eu ainda sinto muita falta do Jorge, mas sei lá, acho que ele foi para um lugar melhor.
- Certeza, Lah. A minha mãe rezou por ele ontem. Eu sentei e rezei junto.
- Os pais dele te ligaram?
- Semana passada. Disseram que vão mudar de cidade. Acho que vão pra Sorocaba, ou algum lugar assim. Eles disseram que aqui lembra muito o Jorge, e querem, sabe, fazer uma vida nova.
- Será que a gente devia também?!
- Não, acho que não. Na vida, infelizmente, a gente acaba perdendo algumas pessoas que a gente gosta muito. Mas cara, é vida...Que que a gente faz?!
- É, eu sei. Mas sei lá, queria sair daqui, morar numa outra cidade, em que ninguém soubesse quem eu sou, de onde eu venho, o que tem no meu passado. Que só quisessem saber o que eu vou fazer daqui pra frente. Entendeu?!
- É, eu sei! Você já viu o André por aí?!
- Não, não vi! Mas já já ele chega!

Quando terminaram o café subiram para a aula. Quase esbarraram com Gabriel, mas ficaram atrás de uma coluna. Só esperaram Gabriel entrar na sala. Quando estavam entrando na sala, ouviram alguns colegas em volta de Gabriel. Eles quase o cercavam, faziam um monte de perguntas. Johnny deu dois passos dentro da sala, pra tentar ouvir o que aconteceu. Pode ouvir Gabriel dizer, 'só sei que ele já tá bem'. Johnny chamou um rapaz da classe e perguntou o que aconteceu.

- Teve uma festa na casa do Rafael, daí ele sofreu um acidente e tá no hospital.
- Tá, valeu!

Johnny saiu correndo da sala, puxou Laysa pelo braço e entraram na sala deles.

- Que foi?! Que aconteceu?!
- O amigo do Gabriel me falou que teve uma festa na casa do Rafael, que ele sofre um acidente e tá no hospital...!

Ambos tentavam esboçar uma alegria por Rafael ter sido punido, pelo ato insano que havia cometido, acreditavam eles. Não sabiam se deviam, afinal a fatalidade que Rafael sofrera, na visão deles, era merecida, mas algo mas outra coisa era mais cabível a ele. Achavam que ele deveria ser preso e pegar pena perpétua. Sentaram-se nas carteiras quando o professor chegou. André chegou logo em seguida. Laysa escreveu um rápido bilhete e entregou para André. Os três sentavam na terceira fila. André leu o bilhete. E um largo sorriso se estampou na sua face. Ele comemorava em silêncio, o revide que Rafael sofrera. Na hora do intervalo, os três foram ver como estava Gabriel. Ele não saiu da cadeira. Apenas abriu uma lata de soda e bebeu enquanto lia uma revista. Johnny estava louco para ir até ele e lhe jogar na cara, todas as coisas que ele queria desde um ano atrás. Mas ele sabia que seria o suficiente para Gabriel descarregar sua decepção nos três. E seria algo pior do que imagens no armário, mensagens no celular e bexigas de água gelada. Quando Gabriel olhou para a porta, eles correram para o pátio.

(Continua...)

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