quinta-feira, 21 de maio de 2009

INTITULADO -- FINAL

Os rapazes pegaram Johnny e Laysa pelo braço, e forçaram os canivetes. Eles foram colocados no banco de trás. O carro saiu pela rua. Johnny e Laysa se olhavam, os olhos arregalados e as mãos trêmulas dos dois eram vigiados pelos dois rapazes. Eles se sentaram ao lado dos amigos, segurando seus pulsos. Eles tiveram de entregar os celulares, que foram desligados e colocados no porta-luvas.

A casa aonde o carro estacionou parecia familiar para Laysa. Ela se lembrava de ter passado na frente, e de ter entrado lá, mas não sabia exatamente. O portão de chapa se abriu, e o carro seguiu para os fundos. Johnny e Laysa foram retirados do carro á força, e levados ao porão. Ficaram sentados num banco de madeira, os braços foram amarrados e as pernas foram presas com silver tape.

Os rapazes saíram do porão, deixando-os presos num espaço de 16m². Não era sujo ou empoeirado, mas um cheiro estranho saía das latas empilhadas ao lado da porta.

Dali a dez minutos, a porta se abriu novamente, abrindo espaço para um feixe de luz invadir o porão, e uma sombra se forma dentro dela. Os passos começam a soar, enquanto a sombra toma forma atrás da pessoa que entra.

- Você acreditaria se eu dissesse que jamais quis isso?!

A voz ecoa pelo porão. Johhny e Laysa reconhecem a voz e a intenção que havia por trás da frase. Gabriel parou na frente dos dois. Nada havia em suas mãos. Johnny não pôde encará-los nos olhos. Olhava para o chão. Ele implorava para que apenas ouvisse. Não deveria fazer nada, ou que algo fosse feito contra ele, de forma física e intensa. Gabriel se aproximou de Laysa, passando a mão sobre a sua cabeça, seus dedos passavam pelos fios escuros do cabelo de Laysa. Ela tentava esquivar a cabeça, mas Gabriel a segurou com a outra mão.

- Eu olhava pra você todo dia. Você acredita que eu até anotava as roupas que você usava?! Ainda que não fosse nada muito chamativo, mesmo que você tivésse de pijama, eu iria saber se você faltou.

Laysa também não conseguia encarar Gabriel nos olhos. Ela tentava controlar um choro que lhe bateu, enquanto ouvia as palavras de Gabriel. Ela não imaginava que seria admirada de tal forma.

Gabriel se levantou e ficou na frente de Johnny. Segurou-o pelo ombro e deu um soco em sua barriga.

- Pára, seu desgraçado!!! - Laysa gritava, soluçando.

Levou um tapa no lado esquerdo do rosto.

A pouca luz que entrava pela porta, e criada por uma fraca lâmpada no teto, subitamente desapareceu. Gabriel voltou para a porta, para abrí-la. Estava trancada.

- Você tá bem?! - Johnny se vira para a amiga.
- Tô, sim.

Gabriel tentou chegar a um interruptor, quando viu uma luz vermelha sair da parede e tomar o porão. Subitamente ela se apaga, e acende de novo. Quando ela ascendeu, dois ratos saíram da gênese da luz, e correram até Gabriel, roendo seus tornozelos. Ele correu para as latas, tirou uma caixa de trás delas, abrindo-a depressa e tirando uma de suas espadas. Em dois golpes ele matou os dois ratos. Seus tênis são lentamente tomados pelo sangue saído das feridas. A maior ficou no sobre o pé direito. Ele mancava na direção de Laysa, quando viu uma sombra pairando na parede.

- Eu te avisei. - Sai uma voz da gênese.

Gabriel pegou sua espada de novo, e tentava golpear a gênese da luz, e a pessoa que saía dela, aquela que ele, Rafael e Bruno tentaram desesperadamente esquecer. Os golpes não atingiam Jorge, que apenas observava o desespero do rapaz.

De trás de Jorge saiu um corvo, que ostentou suas asas sobre Gabriel, voando sobre ele e atingindo seu pescoço. Gabriel caiu ao chão, mas ainda assim, pode golpear o corvo. Seu treinamento de anos fora sua última defesa. Jorge andou até ele, pegou sua espada e a passou bem diante dos olhos de Gabriel, exatamente como ela fizera consigo. Jorge fez três cortes em Gabriel, na testa, no peito e na barriga. Gabriel estava á beira do desmaio. Johnny e Laysa observavam atônitos e sem compreender direito. Podiam reconhecer Jorge no menino, mas não tinham certeza se era ele.

A luz se apaga. Volta a luz do porão. Gabriel esta deitado, sem cortes e sem respirar. A espada parada em sua mão direita, e Jorge perto dele. Johnny e Laysa o reconhecem. Ela começa a chorar, Johnny não acredita no que vê. O amigo cujo enterro ele presenciara com seus olhos, agora estava á sua frente. Jorge pegou a espada de Gabriel e soltou Johnny e Laysa, que não consguiu levantar-se.

- Ele não vai mais. Nunca mais.

Laysa soluçava. Ela esticou a mão tentando tocar o rosto de Jorge. Estava frio, mas ela podia sentí-lo. Johnny pôs a mão sobre o ombro de Jorge e o abraçou. Laysa fez o mesmo. Eles não tinham nem uma pequena idéia de como ou por que Jorge estava lá, mas isso pouco interessava.

- Eu não podia deixar vocês assim. Foi tudo muito rápido – Jorge voltoua ficar diante dos dois, que não mais o sentiam – Eu não ia deixar eles atormentarem vocês pra sempre. O que aconteceu comigo não deve acontecer com ninguém. Nem a eles eu desejo isso. Talvez ao Gabriel. Vocês merecem coisa melhor do que fugir deles. Eu só vim ter certeza disso.

O corpo de Jorge, pouco a pouco, desaparecia. Laysa tentava tocá-lo, mas ele já não era fisicamente palpável.

- Por favor, não vai embora!!

Ela pode ver Jorge sorrindo para ela.

- Quem disse que eu tô indo embora?!

E Jorge desaparece no porão. A porta se abre, e os amigos correm para deixar a casa. Corriam agachados pelo jardim, aonde passaram na frente do carro que os trouxera, pegando seus celulares e mochilas de volta. Eles se olharam, pensando em como sair da casa, quando o portão se abre lentamente. Eles correram rua abaixo, sem olhar pra trás. Não estavam longe da escola, Laysa sabia o caminho para voltar. Pararam em uma padaria, aonde entraram e perguntaram se havia banheiro. Lavaram seus rostos e religaram seus celulares. Laysa ligou para André, e Johnny viu que havia quinze chamadas não atendidas de sua mãe. Ao ligar para ela e ouvir suas exclamações fervorosas, ele relatou que seu celular havia sido perdido, e que agora ele o encontrava.

André não acreditava no relato de Laysa. Ela mal conseguia explicar a ele o que acontecera, pois voltou a chorar. Johnny pegou o telefone, e pediu a André que os encontrásse na porta da escola.

- Vocês vão querer alguma coisa?! – Pergunta o caixa da padaria.
- Não, obrigado! - Johnny responde sem olhar a ele, pega Laysa pela mão e ambos deixam a padaria, correndo assim que seus pés tocam a calçada.

André corria na mesma velocidade rumo ao portão da escola. Só paravam para atravessar as ruas. Se nenhum carro era visto, corriam até mais rápido. André foi o primeiro a chegar ao portão, aonde se sentou na calçada, esperando pelos amigos. Pode vê-los atravessando a rua, e abraçando-o em seguida. Como acontecera com Jorge, foi um abraço longo e apertado.

Johnny começou o relato desde o início. André não conseguia criar a imagem da situação na cabeça. Laysa mandou uma mensagem à sua mãe, dizendo que foram ao cinema, e que estaria em casa dentro de meia hora.

Os três caminhavam pela rua. Laysa parou em um loja de flores, comprou um ramalhete e telefonou à sua mãe. Ela os levou ao cemitério aonde Jorge foi enterrado. A mãe esperou no portão, vendo os três andando juntos para a lápide do amigo. Juntos, seguraram o ramalhete e o colocaram frente á lápide.

Laysa fechou os olhos e rezou pelo amigo. Abraçada por André e Johnny, eles rezaram, baixo, segurando a lápide. Deixaram o cemitério e uma série de más lembranças para trás. A escola iria lhes oferecer uma chance de um reinício. Laysa sabia que Jorge não havia lhes deixado. Ele iria para a escola com eles. Tinha a exata certeza disso.

Os pais de Jorge abriram uma livraria em Sorocaba, batizada com o nome do filho.

O pai de Gabriel sofreu um acidente de carro. O air bag não funcionou. Ele teve um traumatismo craniano.

Na tarde de terça-feira, a polícia de Miami foi chamada por um funcionário de um hotel. Ele encontrou o delegado afogado na banheira e intoxicado por álcool.


FIM

INTITULADO -- PT. 12

Passaram por uma fonte, aonde tomaram sorvete e falaram sobre filmes favoritos. André gostava de 'Star Wars', Johnny adorava a série 'Alien' e Laysa tinha um DVD de 'Curtindo a Vida Adoidado' que ela assistia com muita freqüência. Ela se imaginava dirigindo uma Ferrari algum dia, queria sentir como era estar no topo de um prédio de 100 andares e num estádio lotado, ainda que nem conhecesse os times e pouco conhecimento acerca do jogo que iria prestigiar.

Gabriel não foi citado na conversa. Para os três, as palavras que o representavam não tinham qualquer semelhança com o momento que estavam. Não havia uma nuvem no céu, e os raios de sol que chegavam às dependências do parque não lhes afetavam de forma alguma.

Pela outra mão, Gabriel passara todo o dia pensando em Laysa. Não estava surpreso por ter levado uma bolsada dela. Se estivesse em briga apenas com Johnny ou André, ela faria o que pudesse para defendê-los.
Ele desligava o telefone. Saíra de uma conversa com dois rapazes. Rabiscava umas setas em um mapa. Não era o de sua casa, nem de um banco ou uma loja. Algo que era convencional a ele. Tinha quinze mapas em seu quarto, dez deles pendurados na parede, todos do Extremo Oriente. Seu avô veio de lá no final do século XIX, trazendo consigo mercadorias, roupas e espadas de samurai e uma infinidade de livros em japonês. A coleção de itens samurai fora ampliada ao longo das viagens que o pai de Gabriel fazia ao Japão. Ele e seu pai conseguiram erguer uma firma que vendia componentes de peças japonesas no Brasil, Komozaki Peças, com uma loja na Liberdade, aonde costumavam comer, beber e cantar nos karaokês.

Assim que terminou os rabiscos no mapa, guardou-o em seu armário e começou a limpar suas espadas, como fazia duas vezes ao mês. Passava somente produtos trazidos do Japão pelo seu pai, e cuidadosamente o fazia. Sua coleção já abrangia trinta e seis espadas, todas enfileiradas, e separadas em blocos de seis. A tarefa tomou dele uma hora e quatro minutos. Já chegava ao último bloco. O das mais recentes trazidas. Notou que, das seis, cinco tinham manchas vermelhas. Não sabia a natureza das manchas, mas logo tratou de removê-las. Quando pegou a primeira, viu que a mancha formava um 'J'.

- Impossível!! PAI!! - Lembrou-se de que seu pai não estava em casa.

Não se lembrava da mancha, ao ganhar a espada. Passava o pano por cima, e a mancha sequer clareava. Já se sentia deveras incomodado com o fato. Largou a espada e pegou outra manchada para tentar limpar e viu que outra letra se formava. 'O'. Seus olhos fitavam todas as manchas e completaram o nome 'JORGE'. Ele se levantou num salto, mas tentou crer que era uma coleção de outrem que seu pai comprara. Seria mera coincidência, não fosse a janela se fechando em seguida. A lâmpada do teto se apagou, e uma luz verde incandescente surgia no meio da parede. Escrevia uma mensagem em letra cursiva. “Eles vem, se você chama”.

Gabriel pegou a espada mais próxima da porta e saiu de seu quarto e desceu as escadas sem nem ver aonde pisava. Deixou a casa e jogou-se ao chão no quintal dos fundos. Dali a cinco minutos ele se levantou, foi à cozinha e lavou seu rosto por seis vezes. Ao tentar ver o quarto, com a espada em mãos, testemunhou a janela aberta, nenhuma mensagem na parede e nenhuma mancha nas espadas.

Seus mapas guardados ainda continham os rabiscos que fizera.

Ele não passou muito tempo no quarto depois do ocorrido. Não fez como Bruno e Rafael, ele seguiu com o dia, como se tivesse passado por um pesadelo e este havia terminado.

Nada relatou ao seu pai quando este passou pelo salão subindo à suíte. Apenas desceu ao porão e pegou umas ferramentas.

Johnny, Laysa e André deixaram o parque ás três e cinco. Cada um seguiu à sua casa. Deixaram o assunto da saída da escola numa breve pausa. Tiraram o dia para atualizar outros assuntos e falar sobre alguma coisa que lhes remetesse boas lembranças. Para pessoas da idade deles, já era um fardo grande ver o nome de um amigo escrito em uma lápide.

O segundo dia de suspensão acordou ás dez da manhã. Johnny e André esperavam por Laysa na saída da escola, de onde foram a um cinema. Johnny e André tiveram de voltar logo após para casa, por causa das lições de casa que tinham que adiantar. Qualquer dúvida que pudesse surgir era resolvida com um rápido telefonema.

O terceiro dia ocorreu de forma bem semelhante. Laysa trouxe as anotações das aulas e os três discutiam assuntos relacionados ás matérias.
O quarto de Gabriel não teve outra ocorrência de brutal aparição e desaparecimento. Ele circulou pelo perímetro tentando se esquecer do fato.

Seu telefone tocou por duas vezes durante a noite. Uma página inteira com números, nomes e endereços bem no meio da mesa. Um maço de cigarro, três livros, um caderno, um relógio, um controle de televisão e DVD e uma câmera digital cobriam o marrom da mesa.

Ele desligou o segundo telefonema ás 21:30. Pôs o celular sobre a mesa, marcou dois 'X's no caderno e desligou as luzes.

Às 04:38 AM, Gabriel levantou da cama em um salto. Sua camisa inteira suada e o coração acelerado, ele acabara de sair de um pesadelo. Ele andava por uma calçada, quando foi atacado por um cachorro. Um pastor alemão pulou sobre ele, mordendo seu pescoço, seus braços e sua virilha. Quando ele conseguiu tirar o animal de perto de si, Jorge estava parado no meio da rua. Andava com a mesma roupa que usou no último dia em que viu Gabriel tirar um pedaço de fezes de cachorro em sua calça. O pastor pulou sobre Gabriel novamente, derrubando-o no chão, Jorge se aproximou dele e apenas disse:

- Pára!

Gabriel acendeu a luz e viu seu quarto exatamente como estava, pouco antes de se deitar. As cortinas paradas na mesma posição, o celular desligado sobre a mesa e a porta trancada.

Segunda-feira. 13:15. A maioria dos alunos deixava os portões da escola. André, Johnny e Laysa andavam juntos pelo corredor, como sempre faziam. Gabriel já havia descido. Seguindo a rotina do dia-a-dia, esperavam por seus pais frente ao portão principal. O pai de André foi o primeiro a chegar, buscando-o. Johnny guardava o caderno na mochila, Laysa ligava o celular. Ambos ouvem seus nomes sendo chamados por um colega da sala. Foram chamados para ir uma quadra após a escola. Viram algumas pessoas andando pela calçada, mas ninguém conhecido. Um carro parava na calçada, de onde desceram dois rapazes, cerca de 25 anos de idade, e discretamente colocaram canivetes contra as nucas dos dois.

- Entra. - Foi tudo o que ouviram.

(Continua...)

INTITULADO -- PT. 11

Na saída, Johnny mexia em seu mp3, Laysa ligava para sua mãe, dizendo para ir buscá-la e André comia um chocolate. Ambos saíam juntos da escola. Gabriel saiu de trás de uma coluna, puxou Laysa pela gola e a colocou contra a parede.

- Não me provoca! Não é porque o Rafael não tá aqui, que eu não seria legal vocês. Vê se fica na tua.”

Antes que ele dissése qualquer coisa mais, André puxou sua camiseta pela manga direita, e Johnny deu em empurrão nele. Gabriel deu um pulso e atingiu André na barriga. Johnny deu outro empurrão em Gabriel e lhe deu chute na perna esquerda. No instante em que ele se apoiou no pé esquerdo para chutar com o direito, e quando os seguranças vinham para apartar a briga, Gabriel virou um soco no nariz de Johnny, quebrando-o. Johnny caiu no chão, e Gabriel caiu sobre ele, aplicando socos nos rins e no estômago. André pulou sobre Gabriel, tendo o mesmo tipo de conflito. Laysa, ao ver os amigos brigando de tal forma brutal, ao observar Gabriel aplicando um soco no olho esquerdo de André e fazendo o cair no chão, pegou sua bolsa e golpeou a cabeça de Gabriel. Quando este ia golpear Laysa, o que, para ele seria o sacrifício de todos os esforços anteriores, os seguranças o seguraram pelos braços, levantaram Johnny e André.

- O que tá acontecendo aqui?! - Grita o segurança, sem nenhuma paciência para brigas do tipo.

Os três não responderam. Apenas encaravam Gabriel, enquanto este, olhava para o chão. Todos foram levados à diretoria, aonde ouviram um longo sermão do diretor sobre conduta na escola, enquanto Johnny tentava estancar o sangramento no nariz, e André punha um saco de gelo contra o olho atingido. Gabriel olhava impaciente, isolado dos três num canto da sala. Não se via qualquer sinal de amizade ou boa vontade nele, apenas um raiva contida. Johnny e André experimentaram uma sensação de poder, ao desafiarem a figura dominadora de Gabriel, e terem a notícia do ocorrido com Rafael. Eles esperaram por mais de meia hora depois de Gabriel deixar a sala, para saírem. Seus pais receberam telefonemas sobre o que acontecera. Não houve muitas explicações, a não ser que se tratava de uma briga escolar, nada de muito incomum. Se mais alguma pergunta ocorresse, diriam que estavam defendendo Laysa de Gabriel. Suspensão de três dias. Exceto para Laysa, que pegou apenas um dia de gancho.

Rafael acordou na manhã de terça. A cirurgia na cabeça não foi grande, mas era um local delicado. Lentamente ele olhava o branco das paredes e teto de seu quarto no hospital tomarem forma. Só ouvia o 'bip' de seu aparelho. Ele era “vizinho” de outros pacientes neurológicos. Alguns estavam em seus quartos, outros no corredor, até cessar a hora do corredor, e retornarem ás camas frias.

Passados três quartos de hora de uma refeição á base de proteínas, Rafael achou que algo havia puxado seu cobertor. Suavemente, mas sensível. Ele sentiu outro puxão, e algo gelado passava por seus pés. Os 'bip's do aparelho dispararam quando ele sentiu uma mão segurar sua perna, sobre o cobertor, e o rosto de Jorge surgir sobre a aresta.

- SAI DAQUI!!!! - Rafael tomou todos os “vizinhos” de susto.

Uma enfermeira de plantão correu ao quarto e se deparou com Rafael atirando todos os objetos que alcançava contra, o que ela presumiu ser, a parede. Ele gritava rouca e desesperadamente, chegando a interferir nos cabos ligados a seu corpo. Jorge esticou o dedo da mão esquerda contra ele, o mesmo que esticara em seus últimos suspiros, e andava na direção de Rafael. Seu dedo encostou no chão próximo á cama, e deslisava contra o chão, deixando um rastro negro. “O fim chega para todos” podia ser lido. Rafael sofreu uma parada cardíaca e um queda que fraturou sua coluna, ao bater contra a escada de apoio. Não deixou traços de sangue, mas perdeu os sentidos instantes após a queda. O alarme foi soado no hospital, e o serviço funerário foi chamado. Mais más notícias aos pais de Rafael. Já havia chegado ao receber o telefonema do diretor do hospital. Assim que soube do ocorrido, a mãe de Rafael pegou uma faca da cozinha e a fincou em seu pescoço.

Bruno recebeu um telefonema idêntico. Escreveu uma carta confessando a morte de Jorge, e ingeriu uma caixa de veneno contra ratos. Seu rosto ficou roxo, em seguida pálido, em frente á janela, aonde rezou, dia após dia, pelo perdão de seus atos. A carta terminava com as sentenças: “Que o perdão seja a mim concedido após o pagamento da minha dívida, com a minha vida. Não espero gratidão, apenas reconhecimento e um enterro digno. E que eu tenha o fim que mereço.”

A notícia foi impedida de chegar aos corredores da escola. O diretor vetou de imediato, após ler a carta que Bruno deixara. Ele e a professora da classe de Gabriel fizeram uma visita ao delegado que cuidava do caso de Jorge. Já não recebiam notícias a um tempo. Voltaram para a escola com as notícias de que o delegado havia se aposentado, não havia qualquer arquivo, ou informação sobre o caso, e nenhuma entrevista foi realizada no dia em que o ônibus deixou a escola, de acordo com os registros da delegacia. Como não tinham idéia como agir em relação ao caso, voltaram à escola, fazendo-se várias perguntas.

O delegado descia de um táxi na porta de um hotel á beira-mar em Miami. Seu inglês não era dos mais afiados, mas ele se virava. Deixou uma gorjeta ao motorista e subiu ao quarto, uma bela suíte, cama tamanho 'King' e uma caixa de charutos cubanos rente á varanda. Mais do que ele jamais sonhava em dezessete anos de delegacia. Uma bela vista da praia e uma banheira da hidromassagem completavam o pacote, fruto do “bônus” que recebera do pai de Gabriel. Não se arrependera nem um pouco de sua ambição em demasia ao pedir um grande pagamento em euros. Cansava-se da delegacia, dos inúmeros pedidos de boletim de ocorrência, das pilhas de casos não resolvidos e dos infames pedidos de saídas adiantadas de seus subordinados. Eram um mundo do qual ele estava farto e, na devida ocasião, pôde se ver livre das papeladas.

Já eram mais de oito e meia da noite. Horário local. O delegado deita-se na banheira, deixa uma temperatura a seu agrado e liga a hidromassagem. Nada foi capaz de superar a satisfação, o prazer e a alegria de ver todas as bolhas na água, subitamente se formando, tomando a superfície e rompendo-se, enquanto esvaziava uma garrafa de vinho.

Uma e quinze da tarde. Os três inseparáveis amigos andavam pela rua principal de um movimentado parque há 3 quilômetros da escola. Andavam pela calçada para não atrapalhar os atletas em treinamento.

- Eu chamei a minha mãe ontem – Relata Laysa.
- Por quê?! Ela ficou muito brava?! - André lhe pergunta
- Eu falei que pensei em mudar de escola.
- Nossa, mas por quê?! - Johnny intervém agora.
- Ah, meu, sabe...!! Ir todo dia pra escola, dar de cara com aquele bo*ta do Gabriel...Não sei, desde que o Jorge morreu essa escola parece tão fria pra mim. Eu queria sair de lá, com vocês, e ir pra outro lugar, aonde ninguém soubesse nada de mim, nem da gente. Sei lá, aonde eu pudesse entrar sem ter que ver se tem alguém me olhando, ou falando sobre mim.
- Eu pensei nisso também – Johnny relata – Depois do que aconteceu, eu pensei em sair de lá, começar a série de novo em outro lugar. Se vocês não estivessem na minha sala, ou na minha escola, a gente ia se ver toda tarde que pudéssemos, fora os fins de semana e feriados.

Eles discutiram por uma hora sobre a questão. Laysa e sua mãe não haviam chegado a uma conclusão se a saída da escola deveria ser posta em prática. Era o meio do semestre. Qualquer outra escola seria como um “bonde pego andando”, de acordo com a famosa expressão.

(Continua...)

INTITULADO -- PT. 10

A ambulância levou cerca de sete minutos para chegar. A polícia chegou em cinco minutos. Duas viaturas estacionaram em frente á casa de Rafael. Os seis policiais subiram ao quarto e abriram o inquérito. Três para-médicos subiram levando a maca consigo. Um deles levava também um avental, que foi usado para cobrir Rafael. A maca foi armada próxima á cama. Os médicos fizeram um curativo para tentar minimizar o sangramento, mas já constataram que seria necessário o uso de pontos cirúrgicos, radiografia e exames. Dois dos policiais ficaram no quarto, interrogando Natasha e Thaís. Perguntavam sobre como foram chamadas, quanto foram pagas pelo serviço, o que faziam quando Rafael se acidentou, e enfatizaram a questão se sabiam que Rafael era menor. Ele ainda tinha dezessete anos, só completaria dezoito dali a sete meses. As duas foram levadas para a delegacia, fichadas e presas por prostituição e aliciamento de menores. Nenhuma tinha dinheiro suficiente para pagar um advogado. Teriam de contar com a sorte de seu indicado ser alguém de competência e digno de alguma confiança.

Os outros policiais investigavam as dependências da casa de Rafael. O local da pista, bar, sala de estar, a sala de televisão toda equipada com equipamento de projeção e home-theater, o extenso hall de entrada, piso de mármore e tapete persa, trazido pela mãe de Rafael, numa viagem a negócios.

Dentre os convidados da festa, dois eram menores. De fato, eram duas meninas, que Gabriel tinha convidado. Dois rapazes serviram bebida a elas uma hora antes da polícia chegar. As bebidas eram misturadas, e as duas não haviam comido nada. Os quatro foram levados à delegacia. Os pais das duas meninas tiveram de ser acordados e notificados que teriam que ir buscar suas filhas na delegacia e assinar alguns papéis. O pai de uma delas, disse que chamaria um advogado para processar os rapazes e Rafael. Perguntava sem parar sobre os detalhes da festa, aonde era e o quanto sua filha havia bebido. Os fatos em nada condiziam com a versão dada pela filha antes da festa. Ela disse que iria estudar na casa da amiga para um exame de física que ocorreria na semana seguinte. Apesar da suspeita, os pais concederam e deram dinheiro para a filha chamar um táxi.

O advogado seria chamado ás dez da manhã do domingo. Algumas desculpas pela hora da ligação, uma breve introdução do assunto e medidas legais a serem tomadas. Isso ocuparia boa parte do domingo e da semana . Para a filha, nada de sair pelo próximo trimestre. Internet em casa apenas para trabalhos escolares. O Orkut teria de esperar noventa dias.

Rafael estava tendo a cabeça examinada ás três da manhã, pela equipe de plantão. A radiografia mostrou uma concussão na parte de trás do cérebro. Um vaso estourou e o sangue vazou para o cérebro. A cirurgia seria feita para retirar o sangue e estancar.

A polícia já havia terminado o inquérito na casa de Rafael. Todas as pessoas que trabalhavam na casa foram dispensadas, a casa foi revistada, mas apenas foram encontradas as bebidas da festa, e, com exceção das duas meninas, todos na festa tinham mais de 18 anos. Gabriel completava no mês anterior. Bruno já era maior de idade há 5 meses.

Um detetive da polícia foi chamado para avisar os pais de Rafael, assim que chegassem na manhã de domingo.

A escola amanheceu sob uma chuva fraca e um vento a noroeste, que umedeciam os portões da escola, fazendo todos os alunos recorrerem a casacos, gorros, luvas e cachecóis. A temperatura não passou dos 16 graus o dia todo. Gabriel chegou sozinho à escola. Passara boa parte da noite respondendo ao questionário dos seus pais, em especial, da sua mãe, sobre o que ocorrera na festa. A menina que foi levada a delegacia nada tinha a ver com ele, mas ainda assim seu pai se enfurecia pelo fato. Alguns dias depois do delegado se inquietar, ele volta a ser atenção da polícia. Depois de um habitual sermão, Gabriel vestiu um casaco que seu pai trouxera de Nova Orleans, e foi à escola.

A chuva não o incomodava. Já tinha muita coisa na cabeça a pensar, que uma simples toalha não fosse capaz de arrumar tudo. Passou pelo portão ás sete e dez. Foi direto pra sala. Não costumava cumprimentar ninguém, exceto Bruno e Rafael.

Johnny chegou ás sete e quinze. Encontrou Laysa na cantina. Ela tomava um café com alguns muffins, ouvindo Oasis no mp3. Ao ver Johnny, ela se levantou e ofereceu o café. Johnny recusou, mas comprou um no balcão.

- Como vão as coisas?! - Johnny quebra o silêncio.
- Acho que tô bem. Eu ainda sinto muita falta do Jorge, mas sei lá, acho que ele foi para um lugar melhor.
- Certeza, Lah. A minha mãe rezou por ele ontem. Eu sentei e rezei junto.
- Os pais dele te ligaram?
- Semana passada. Disseram que vão mudar de cidade. Acho que vão pra Sorocaba, ou algum lugar assim. Eles disseram que aqui lembra muito o Jorge, e querem, sabe, fazer uma vida nova.
- Será que a gente devia também?!
- Não, acho que não. Na vida, infelizmente, a gente acaba perdendo algumas pessoas que a gente gosta muito. Mas cara, é vida...Que que a gente faz?!
- É, eu sei. Mas sei lá, queria sair daqui, morar numa outra cidade, em que ninguém soubesse quem eu sou, de onde eu venho, o que tem no meu passado. Que só quisessem saber o que eu vou fazer daqui pra frente. Entendeu?!
- É, eu sei! Você já viu o André por aí?!
- Não, não vi! Mas já já ele chega!

Quando terminaram o café subiram para a aula. Quase esbarraram com Gabriel, mas ficaram atrás de uma coluna. Só esperaram Gabriel entrar na sala. Quando estavam entrando na sala, ouviram alguns colegas em volta de Gabriel. Eles quase o cercavam, faziam um monte de perguntas. Johnny deu dois passos dentro da sala, pra tentar ouvir o que aconteceu. Pode ouvir Gabriel dizer, 'só sei que ele já tá bem'. Johnny chamou um rapaz da classe e perguntou o que aconteceu.

- Teve uma festa na casa do Rafael, daí ele sofreu um acidente e tá no hospital.
- Tá, valeu!

Johnny saiu correndo da sala, puxou Laysa pelo braço e entraram na sala deles.

- Que foi?! Que aconteceu?!
- O amigo do Gabriel me falou que teve uma festa na casa do Rafael, que ele sofre um acidente e tá no hospital...!

Ambos tentavam esboçar uma alegria por Rafael ter sido punido, pelo ato insano que havia cometido, acreditavam eles. Não sabiam se deviam, afinal a fatalidade que Rafael sofrera, na visão deles, era merecida, mas algo mas outra coisa era mais cabível a ele. Achavam que ele deveria ser preso e pegar pena perpétua. Sentaram-se nas carteiras quando o professor chegou. André chegou logo em seguida. Laysa escreveu um rápido bilhete e entregou para André. Os três sentavam na terceira fila. André leu o bilhete. E um largo sorriso se estampou na sua face. Ele comemorava em silêncio, o revide que Rafael sofrera. Na hora do intervalo, os três foram ver como estava Gabriel. Ele não saiu da cadeira. Apenas abriu uma lata de soda e bebeu enquanto lia uma revista. Johnny estava louco para ir até ele e lhe jogar na cara, todas as coisas que ele queria desde um ano atrás. Mas ele sabia que seria o suficiente para Gabriel descarregar sua decepção nos três. E seria algo pior do que imagens no armário, mensagens no celular e bexigas de água gelada. Quando Gabriel olhou para a porta, eles correram para o pátio.

(Continua...)

INTITULADO -- PT. 9

O garoto tomou mais um calmante para dormir. Antes de se deitar, mandou uma mensagem para Bruno e Gabriel, confirmando a festa e pedindo sugestões de músicas. Elas seriam mandadas ao DJ pela manhã.

Ao decorrer da manhã e tarde de sábado, a casa de Rafael cresce em movimento moderadamente, seus pais foram passar o final de semana em Barra do Una. Ele teve de garantir que a casa iria permanecer intacta. O quintal foi todo varrido, a piscina foi coberta, alguns móveis foram para o andar de cima, e as luzes da festa começavam a ser instaladas.

Gabriel e Bruno foram dentre os primeiros a chegar. Ambos traziam alguns amigos e umas bebidas. Gabriel trouxe Saquê e Bruno trouxe Vodca. Gabriel ajudou a armar algumas coisas, enquanto Bruno guardava as bebidas trazidas. Se reuniram para algumas conversas antes do evento começar. Rafael subiu para tomar banho, Gabriel ficou encarregado de responder ás perguntas que o pessoal provavelmente faria. Ele não foi procurado.

Ás nove da noite, cerca de 60 pessoas já estavam na casa. A maioria já na pista. O DJ seguira as orientações de Rafael linha a linha. Gabriel e os amigos já haviam esvaziado a garrafa de Saquê trazida, e um bom número de latas de cerveja. Bruno conversava num sofá com duas amigas da escola.

O relógio da parede já batia meia-noite. A casa, já com cerca de 70 pessoas, os garçons trabalhando para servir á todos, o Dj tocando uma trilha de músicas remixadas, duas mulheres entram na casa. Natasha e Thaís se apresentam a Rafael, que as cumprimenta e fala para subirem ao quarto dele. Ele subirá em dois minutos. Ele passa por entre as pessoas da pista, procurando por Gabriel. Ele está próximo a um dos cantos, conversando com um grupo de amigos. Rafael o chama para fora, uma conversa seria inaudível em meio aquele ambiente.

-Eu vou subir agora, elas chegaram! Você toma conta da festa?! Ahm avisa o Bruno, tá?!

-Pode deixar, cara, vai lá! E divirta-se, hein?!

-Deixa comigo!

Rafael deixou a pista, bebeu mais um drink, pegou uma caixa de cerveja da geladeira e subiu para o quarto. Natasha e Thaís o esperavam. As duas trajando roupas bem justas, curtas, e decotes muito abertos. As finas alças que passavam por seus ombros cobriam em parte, as marcas de sol. Thaís estava sentada na cama, desamarrando a sandalha. Natasha estava no banheiro arrumando o cabelo e guardando a maquiagem na bolsa.

Ao abrir a porta, fitou Thaís sentada na cama, retocando a maquiagem. Rafael ligou o computador, fechou janela e trancou a porta. A trilha de músicas já estava selecionada numa pasta em seu Media Player. Programou para tocar todas em seqüência e voltar para a primeira, após a reprodução da última. Minimizou a janela e levantou-se, para sentar-se na cama.

-Querem beber alguma coisa?!

Thaís abriu uma lata de cerveja, Natasha agradeceu, mas não quis beber. Thaís deixou a lata sobre a mesa, a primeira música já havia acabado. A segunda começava a ser reproduzida. Eram algumas baladas que ele havia separado, mais alguns blues e duas temáticas, intencionalmente separadas. A primeira estava ecoando nas caixas de som. Natasha apoiou seus braços sobre Thaís e começou a rebolar sensualmente, encarando Rafael nos olhos e tirando seu sua blusa. Thaís retirou seu sutiã, abrindo lentamente a fivela, seguindo o ritmo da música. O show continuava, Rafael passava seus olhos por sobre os corpos das duas, indo e voltando, subindo e descendo. Gostava de reparar nas partes do corpo de uma mulher que mais lhe agradavam. Seus olhares as cobriam com freqüência. Olhava o quanto queria, e o quanto deixou de olhar para outras mulheres na rua. Sentia-se confiante e orgulhoso. Elas estavam lá para satisfazê-lo, de todas as formas. Não eram de passagem, nem se vestiam discretamente. Embora, já na quarta música sendo reproduzida, Natasha e Thaís nada vestiam, e não mostravam nenhuma timidez, faziam isso havia três anos.

Rafael suava, e seu coração pulsava aceleradamente. Ele sentia arrepios que lhe corriam o corpo todo. A quarta música acabava. Para ele, era o sinal de que a primeira fase do programa havia terminado. Dali, começaria a segunda, e Rafael se veria no meio de Natasha e Thaís, extravagando suas potência e sentindo-se o rei da noite. Ele se levantou, sem pressa.

-Vou pegar umas coisas no banheiro, você – Apontando para Natasha – pode deitar na cama, você – Agora para Thaís – me espera ao lado da porta. Rafael entrou no banheiro, as duas seguiam as ordens. Rafael procurava camisinhas e um gel no armário do banheiro. Colocou tudo em cima da pira e tirou a roupa, para tomar uma breve ducha. Assim que deixou o box, notou mais vapor do que ele achava que haveria. Mas nem ligou para o fato. Quando se olhou no espelho, outro arrepio lhe subiu dos pés à cabeça, mas era gelado, opostamente aos primeiros. Rafael pôde ver Jorge parado ao lado do box, encarando-o nos olhos. Rafael se virou e deu de cara com o menino. Jorge estava pálido, seus olhos vermelhos, e sua roupa aparentava estar molhada.

-Sai daqui!! Me deixa em paz!!! SAI DAQUI!!! VOCÊ NÃO EXISTE!!! me deixa em paz!!!! - Rafael grita, enquanto Jorge começava a andar em sua direção.

Quando Rafael tentou correr para a porta do banheiro, seus pés patinaram pelo chão escorregadio, fazendo-o cair, chocando sua cabeça contra a privada, deixando-o inconsciente. O choque contra a privada abriu uma ferida na cabeça de Rafael, um pouco acima de sua nuca. O vermelho do sangue já se misturava com o verde-limão dos azulejos quadriculados, que cobriam toda a área do banheiro. Natasha e Thaís abriram a porta do banheiro, devido ao susto, e viram Rafael desmaiado no chão do quarto. Natasha correu para o corpo de Rafael, tentando reanimá-lo. Thaís se vestiu afobadamente, mal arrumou a roupa, e saiu do quarto, tentando chamar ajuda. Um dos garçons subiu e encontrou Natasha, agora também vestida, colocando Rafael sob a cama.

A confusão chamou a atenção de algumas pessoas que passavam perto da escada quando o garçom subiu. Ele pegou o telefone mais próximo e chamou uma ambulância. Alguns amigos de Rafael apontavam seus dedos para as duas, e as condenavam por Rafael estar inconsciente. Um amigo de balada de Rafael chamou a polícia, para prender Natasha e Thaís, acusando-as de agressão. Algumas pessoas na festa já estavam bêbadas, ou “alegres”, quando começou o alvoroço que tomou conta do quarto de Rafael. Alguns se empurravam no corredor, no quarto e no topo da escada, tentando ver como estava Rafael, ou tentando ter uma idéia do que aconteceu. O segurança da festa logo subiu para o quarto, tirou todos de lá, exceto Natasha e Thaís, e verificou com o garçom se a ambulância foi chamada. Alguns amigos de Rafael insistiam para que a polícia fosse chamada para prender as duas garotas de programa. O segurança foi obrigado a chamar. Rafael era menor.

(Continua...)

INTITULADO -- PT. 8

Bruno passou o dia seguinte, durante todo o tempo, trancado no quarto. Saiu apenas três vezes, todas para ir ao banheiro e pegar alguma coisa na cozinha. Voltava correndo para o quarto, apenas olhando para o chão. Sua mãe, que voltara para casa mais cedo, estranhou seu isolamento no quarto. Bruno afirmou ser apenas um mal-estar. Quando sua mãe entrou no quarto, Bruno estava deitado na cama, com uma toalha sobre a testa. O garoto suava demais. Boa parte da fronha do travesseiro estava molhada, assim como a camiseta que estava vestindo.

-Filho, você não quer tomar um banho quente? Quer que eu prepare alguma coisa?
-Vou tomar depois, mãe. Ah, você me traz um mamão, por favor?!
-Tudo bem!

Ela se levantou e deixou o quarto. Bruno ficou olhando para o teto. Seus olhos fitavam a lâmpada, a poucos metros sobre a sua cabeça. Em mais uma tentativa de esquecer Jorge, ele se concentrou na lâmpada e numa aula que teve, uns meses atrás, sobre a eletricidade. Sua mãe bate na porta e entregou o mamão. Ele se levantou e começou a comê-lo. Bem devagar, tirando todas as sementes, primeiro. Quando estava para comer a segunda metade, seu telefone tocou.

-Alô?
-E aí, cara?!
-Quem fala?
-Como 'quem fala?'? Sou eu, Rafa!
-Ah, e aí?!
-Cara, a gente vai dar uma festa amanhã á noite, quer vir?! - Bruno não tinha a menor idéia do que estava acontecendo, e nem se sentia disposto a ir a uma festa. Porém, dada a amizade que tinha com Rafael, aceitou o convite.
-Que horas vai ser?
-A gente vai começar umas nove horas.
-Beleza, então! Vai ser na sua casa, mesmo?!
-Vai! Agora olha só, e vê se não conta pra ninguém! O pai do Gabriel fez o delegado arquivar o processo! A gente tá livre, cara! - Bruno não se sentia aliviado ao ouvir aquilo, mais do que isso, sentia-se ainda mais culpado – Pode ir pra escola tranqüilo!
-Ah, tá, bom, bacana, cara – Sua voz refletia o que sentia no momento – Te encontro lá, então! Tchau! - E desligou o telefone, sem que ouvisse uma resposta do colega.

A casa de Rafael recebeu várias pessoas, o dia todo. Decoradores, um DJ, dois 'barman's, dois garçons e um motorista foram recebidos por Rafael, recebiam instruções, acertavam orçamentos e combinavam horários. Tudo estava marcado para ás nove horas da noite do dia seguinte. Era véspera de feriado. Rafael cuidou de tudo até as altas horas da madrugada, nada poderia ficar para o dia seguinte. O rapaz já estava sendo tomado pelo sono, quando sentou-se numa cadeira da cozinha e abriu uma cerveja. Organizou as listas que fez para a festa e levou para o seu quarto. Deixou todas empilhadas na mesa de seu quarto e foi para o banheiro, levando sua cerveja consigo. Já eram duas e meia da manhã. Ele tirou sua camiseta e estava para tirar o tênis do pé direito, preparando-se para tomar banho. Abriu a porta do box e se deparou com uma grande onda de vapor saindo dele.

-Cacete, quem deixou o chuveiro aberto?!

Abriu a janela e a porta do banheiro, para o vapor sair, quando se voltou para o box, viu um menino enforcado na ducha. Rafael sentiu seu coração chegar á sua boca. Quando pôs o pé para fora, para chamar alguém, o menino o chama.

-Se vocês calarem a boca dele, eu calo a sua. Pra sempre...

Rafael reconheceu a voz de Jorge. Não podia acreditar que o menino enforcado era o mesmo que haviam matado há alguns dias. Rafael sentiu um arrepio que tomou seu corpo por inteiro e seus olhos quase saltaram. Ele fechou a porta do box com força, quase quebrando a porta. Quando a abriu de novo, bem devagar, o box estava vazio, e não havia vapor algum.

Saiu do banheiro correndo para o quarto de seus pais. Revistou todas as gavetas da penteadeira de sua mãe. Em meio a gavetas de fotografias antigas, pentes e grampos de cabelo, havia uma com remédios. Sua mãe tomava calmantes nos dias de TPM, todos receitados pelo seu médico particular. Rafael abriu a gaveta e começou a procurar por um desesperadamente, jogando todos os que não eram do efeito desejado no chão. Quando visualizou a tarja preta, com um 'Z' marrom em cima, logo pegou a caixa, rasgou-a no meio e pegou uma cartela inteira. Enquanto corria para a cozinha em busca de um copo d'água, arrancou três comprimidos de cartela e os jogou em sua boca, o copo só serviu para engolir o último. Suas pernas o fizeram desabar, e ele se arrastou para debaixo do fogão, aonde dormiu.

Quando a mãe de Rafael chegou em casa, o som de sua entrada não foi suficiente para acordar Rafael. Fazia duas horas que ele havia dormido. Sem resposta do seu chamado, a mãe subiu para o quarto, aonde se deparou com uma trilha de caixas de remédios, pírulas e cartelas vazias, que davam na penteadeira. Enquanto arrumava-os de volta, pensava em como punir o filho pelo ato não autorizado. Enraivecida, entrou no quarto de Rafael, abriu a primeira gaveta de sua mesa e espalhou seus Cds pelo chão. Ao entrar na cozinha, ela tropeçou nos pés de Rafael.

-Car..ho, muleque!!! Levanta daí agora.

Rafael manteve-se imóvel. Sua mãe o agarrou pelo pescoço, e começou a sacudí-lo. Rafael acordou no susto. E berrou na cara de sua mãe, que o largou no chão.

-Que você tá fazendo aí?!!!

Rafael não contou sobre a aparição, não teria credibilidade alguma. Inventou que foi assaltado, e precisava de um calmante, para não ter um ataque cardíaco.

-Vê se pede da próxima vez – E a mãe sai, sem dizer mais nada.

Rafael voltou para o quarto, e passou o dia de maneira muito similar a Bruno. Saíra apenas duas vezes, uma para ir ao lavabo, não tinha coragem para voltar ao banheiro, e a segunda para atender um telefonema, de uma das pessoas que iriam trabalhar na festa. Era o DJ, perguntando que trilha Rafael preferiria que tocasse. Ele disse para começar com uma trilha de músicas mais antigas, as famosas discos dos anos 60 e 70, e depois tocar algo mais atual, a começar pelas músicas mais tocadas na baladas dos tempos atuais. A conversa fez Rafael esquecer o evento no banheiro. O telefonema ocorreu ás nove e meia da noite. Até aquele momento, Rafael passara todo o tempo no quarto, tentando se convencer de que tudo fora apenas uma ilusão sua, de que nada teria a ver com Jorge, e que, graças ao pai de Gabriel, ninguém ficaria sabendo do que aconteceu, tampouco viriam atrás dele.

(Continua...)

sexta-feira, 3 de abril de 2009

INTITULADO -- PT. 7

Na manhã seguinte, Luis Guilherme Aikashi, o pai de Gabriel, desceu de sua Porsche para a sala do delegado.

- Você que está cuidando do caso da escola Demóstenes?! - Foi direto ao ponto, sem nem cumprimentar o delegado.

- Exato. Alguma informação sobre o caso?!

- Sim, tenho uma. Na verdade, é uma proposta. - Tirou um talão de cheque do bolso. O delegado olhou surpreso, mas não ficou indignado - Quanto o senhor quer para arquivar o caso?!

O delegado largou uma pasta que estava examinando, viu se não havia ninguém ao lado da porta e semi-fechou as persianas.

- Cinquenta mil.

- Hmm...Ambicioso..!

- Euros! E um bom pretexto!

Luis parou de preencher o cheque.

- Para o que?!

- Para o que eu vou dizer se perguntarem desse caso.

Diga que não pode falar nada e pronto. Isso não é problema meu. - Ele termina o cheque e entrega ao delegado – Outra coisa, a gente não teve essa conversa, eu não vim aqui hoje e você não me conhece! - Saiu sem se despedir, quase batendo a porta. Seu Porsche arrancou rua abaixo, rumo á sua casa.

Passados vinte e cinco minutos, Luiz Guilherme chegou em sua casa. Viu o filho ao telefone, com Rafael. Assim que viu o pai desligou o telefone e perguntou como foi.

- Já resolvi tudo. O delegado foi um pouco acima do que eu imaginava, mas já está tudo resolvido.

Gabriel esboçou uma sensação de alívio, respirou fundo, e estava a caminho da cozinha, quando o pai lhe segurou pela gola da camisa.

- Presta bem atenção, muleque. É a última vez que eu fiz costa-quente pra você. Daqui pra freente, tá sozinho. Não pense que eu não acho que vocês tiveram alguma coisa com o desapareciemtno do muleque. Mas a essa altura do campeonato, eu me recuso a deixar esse caso ferrar minha eleição. Então, colabora, muleque!! - Empurra Gabriel, que quase esbarra no armário de bebidas. Seu pai o empurra novamente em direção á cozinha – Vai, se mexe, cara!

Os pais de Jorge passaram os últimos dias, na sua totalidade, preparando o funeral do filho. Foram convidados André, Johnny, Laysa, suas famílias, os parentes de Jorge que estavam na cidade, e alguns membros do corpo docente da escola. Todos prontamente apareceram e expressaram seus sentimentos. Lágrimas corriam pelo rosto da mãe de Jorge, que segurava uma foto sua com o falecido filho, e tentava repetidamente não olhar para o caixão, fechando os olhos e se abraçando com seu marido. Izabella levou uma caixa de flores e as jogou sobre o caixão. Laysa, André e Johnny também levaram algumas rosas e as colocaram ao lado da lápide. Junto com elas, uma carta escrita pelos três. Laysa pediu ao padre que lêsse a carta durante a missa. Ele atendeu ao pedido e, logo após rezar a missa emhomenagem a Jorge, pediu a atenção de todos que estavam presentes, e recitou as palavras dos amigos. Laysa foi ao encontro da mãe de Jorge, e lhe mostrou um anel que Jorge havia lhe dado de presente de aniversário. Os pais de Laysa a seguiram. Sua mãe abraçou fortemente a mãe de Jorge, em seguida tirou um cartão de visitas de sua bolsa e lhe entregou.

- Qualquer hora que você precisar conversar, me liga.

- Obrigada. Muito obrigada pelo apoio – Conseguiu responder em meio aos soluços.

André apoiou a amiga, ao lado de Johnny.

A cerca de 50 metros dali, Bruno observava o enterro. Suas lágrimas batiam em seu queixo e caíam ao chão. Quando sentiiu que alguém notara sua presença saiu correndo. Parou numa esquina vazia, com um bar, um prédio comercial e um barbeiro. Os estabelecimentos não estavam com movimento. Ele se sentou na calçada e olhou para o seu reflexo no bueiro, formado por uma poça d'água. Não conseguia pensar, falar ou respirar direito. Apenas pensava no menino que perdera a vida em suas mãos. Só pensava no seu rosto, na expressão de medo nos olhos de Jorge, e no calor que saía da boca de Rafael, enquanto ameaçava o garoto, rindo de seu desespero, e no brilho de uma das espadas da coleção de Gabriel, passada em frente ao rosto de Jorge, e o reflexo em seu rosto. Sentia-se extremamente culpado pelo que houve, e achava que deveria ser condenado á morte, por uma corte marcial altamente severa, uma caça ás bruxas, ou coisa do tipo.

Foi andando lentamente para casa, no caminho passou em frente a uma livraria. Parou um segundo para ver os materiais á venda, se algo lhe chamava a atenção para tentar esquecer a última meia hora. Dentre os livros na vitrine, entre culinária, biografias, infantis e revistas, o penúltimo livro da estante, de capa dura, azul, e sob o título 'Crianças superdotadas' havia um menino. Bruno prestou atenção, mesmo tentando desviar seu olhar, e aquele menino, de casaco de capuz vermelho era quase idêntico a Jorge, e aparentemente encarava Bruno com uma expressão fria. Um pouco á direita de seu rosto, a frase em roxo 'Eles!' fez Bruno olhar diretamente para a sua direita, num susto. Depois de olhar o seu redor, voltou sua atenção para o livro, que continha apenas o título, e um menino que em nada se parecia com Jorge.

(Continua...)

INTITULADO -- PT. 6

Johnny fixou a atenção na porta da escola. Viu o delegado e o diretor na porta. Houve um aperto de mãos e o delegado entrou na viatura, acompanhado por um outro policial. Johnny desceu de onde o carro estava, despediu-se de sua mãe e entrou na escola. O pátio não estava cheio, e Gabriel não estava.

- Johnny! - André o chama, colocando a mão sobre seu ombro.

Johnny leva um susto.

- O que?!! Ah, oi André!

- Nossa, cara, tá tudo bem?!

- Eu não diria...

Os dois foram até a sala, Johnny sempre olhava para os lados. André tentava alcamar o amigo.Ao final da aula, Johnny permaneceu na sala. André ficou ao lado dele. Podiam ver a sala vizinha ser rapidamente evacuada. Seguiram o grupo de longe. Este entrou num ônibus. Rumo à delegacia, pensaram os dois.

- Você viu a Laysa, hoje?! - André olha para o corredor.

- Não, verdade! Será que ela faltou hoje?!

- Sei lá, ela nunca falta!

Eles desceram as escadas, vendo se achavam a amiga. Johnny pegou o celular e a chamou pela discagem rápida. Laysa estava atrás da quadra, chorando. Eles evitaram correr para não chamar a atençao, mas seguiram depressa. Encontraram Laysa assoando o nariz e enchugando os olhos. Johnny põe a mão sobre a cabeça dela. Ela mostra o celular com uma mensagem recebida durante o intervalo.

- “Se eu tiver que falar com o delegado, você e seus amiguinhos não terão um dia fácil!” - Johnny lê o texto. Ele devolveu o celular para a Laysa e pôs a mão sobre o rosto. - Me fala que eles foram junto com a sala!

- Acho que foram.

- Anda, vamos sair daqui!

- Pra onde? - André hesita

- Sei lá, qualquer lugar! Pensa! Eles vão procurar a gente aqui quando saírem!

Os três arrumaram suas coisas para sair. Laysa parou no banheiro para se recompôr. Foram ao shopping, e entraram num McDonald's.

O ônibus voltava a ficar cheio, na frente da delegacia. O professor observou Rafael e Gabriel entrarem nele. Olhou para o delegado, que a chamara.

- Fica de olho neles!

Rafael e Gabriel sentaram-se nas poltronas 07 e 08. Rafael encara o colega.

- E agora?!

- A gente conversa na escola.

Assim que o ônibus saiu, ambos andaram juntos para a esquina.

- O que você falou?!

- Que era tudo implicância dele. Só porque uma vez a gente ficou de castigo ele resolveu por a culpra toda na gente, por qualquer coisinha. Acho que esse idiota não aprendeu a calar a boca. E você, falou o quê?

- Que a gente tinha pego suspensão, depois os serventes ficaram de olho na gente. Falei que eles tinham colado aquelas coisas no armário pra culpar a gente. Cara, a gente não devia ter feito aquilo...

- Foda-se, cara! Já foi!! Eu vou é cuidar desses caras, antes que a gente se ferre. Mas eu vou fazer uma coisa antes. Acho que o meu pai pode dar uma mãozinha.

Rafael entendeu de cara. Despediu-se do amigo e pegou um ônibus. Gabriel pegou o celular e fez um telefonema.

(Continua...)

INTITULADO -- PT. 5

Johnny entra na sala do delegado. Não dirige a palavra a ele, nem o encara nos olhos.

- Senhor Johnny Willians?

- Sim, senhor - Johnny responde baixo, olhando para a mesa.

- O senhor era próximo do sr. Jorge Teixeira Lopes?

- Sim, senhor. A gente estudava na mesma sala. Inclusive marcamos um estudo em grupo para sábado, para uma prova de biologia na semana que vem. Foi na hora do intervalo, quinta passada.

- Aonde estava no dia do crime?

- A gente saiu da sala, fomos comer alguma coisa na cantina. Depois eu fui pra minha casa. Tinha uns moleques que ficavam enchendo a gente, por causa do que aconteceu com a Laysa, acho que ela já deve ter contado isso. Daí eu fui pra minha casa e ele esperou pela mãe dele.

- Quem foi te buscar na escola?

- Minha mãe.

- O que fez depois?

- Eu fiquei fazendo um trabalho de redação em casa.

- A srta. Laysa e o sr. André comentaram sobre três rapazes, Rafael, Gabriel e Bruno. Pelos relatos, eram três rapazes que frequentemente incomodavam vocês, sendo necessária a intervenção dos pais do sr. Jorge. Ainda de acordo com seus amigos, um desses rapazes, o sr. Rafael Andrade, havia perturbado vocês com mais freqüência, chegando a colar imagens obscenas nos seus armários, cortejar a srta. Laysa de uma forma desrespeitosa e ameaçar vocês. Isso tudo lhe confere, sr. Willians?

- Sim, senhor! - Johnny teve a mesma reação dos amigos ao ouvir o nome dos rapazes, porém estava mais enraivecido.

- Algo a acrescentar?

- Tenho, sim! - Johnny o encarou nos olhos pela primeira vez. Sua expressão era um misto de raiva, rancor e desespero – creio que seja uma conseqüência desse fato, a minha presença aqui, ou um pouco mais do que isso. Esse outro, Gabriel, Gabriel Aikashi, era um colega de sala do Rafael. Eles se conheceram na quinta-série, quando foram para a diretoria depois de uma 'treta' no recreio. Dali pra frente, eles estavam sempre andando juntos, eu nunca via eles separados. A não ser depois da aula, em alguns dias. A classe deles era vizinha da minha sala, ano passado. O Jorge estudava comigo. Um dia a gente estava na cantina, e eles sentaram perto da gente. Foi como se o Rafael quisesse apresentar o novo amigo para a gente. Eles jogavam batatas-fritas na nossa cara, quando eu falei que ia chamar o servente, o Gabriel tirou uma faca da mochila. Ele pôs de volta pra ninguém ver, veio até mim e disse pra não falar nada, se eu gostásse da minha vida. E as ameaças continuaram. Além disso, foi dele a idéia de colar aquelas fotos nos nossos armários.

- O senhor chegou a fazer alguma queixa contra ele?

Johnny abaixou a cabeça de novo. Ele rezava para não ouvi mais uma ameaça, ou coisa pior, depois de ter feito seu relato.

- Não, senhor. Aliás, essa é a primeira vez que eu falo sobre isso, sem ser com o Jorge, a Laysa ou o André.

- Você não sabe que esse tipo de denúncia é feito sob sigilo, sr. Willians? Ninguém teria como saber que foi você.

- Eu sei disso. Mas se ele desconfiásse que alguém sabe disso, sendo eu, ou não, ele iria me culpar. Eu vi ele fumando maconha perto da escola, não relatei também.

O delegado esfregou a testa. Via á sua frente um rapaz quase traumatizado, e uma testemunha em potencial, mas com um problema sério e um amigo falecido.

- É o seguinte, rapaz. Eu vou ter que chamar esses rapazes para prestar depoimento...

- Não, senhor, por favor! - Johnny o interrompeu sem hesitar.

- Me ouve, pelo menos! Eu direi que estamos chamando todos os rapazes para depoimento, a gente chama toda a sala deles. Qual é?

Johnny pensou por uns três segundos. Olhou para a parede, em busca de alguma imagem que pudesse lhe oferecer conforto.

- Sala 21, segundo andar.

O delegado anotou em seu papel. Anotou os detalhes de depoimento de Johnny, e o nome Gabriel Aikashi. Depois recostou-se na cadeira.

- Algo mais?

- Não, senhor?

- Pois bem... - O delegado pegou uma folha, uma caneta e entregou a Johnny – Coloca seu nome, telefone e e-mail.

Johnny o fez e deixou a sala.

André estava tomando um refrigerante. Seu pai, café. Laysa estava roendo as unhas, olhando para um quadro na parede. Os três sentados num sofá. Levantaram quase que ao mesmo tempo, quando Johnny deixou a sala.

- E aí, o que aconteceu? - André quebrou o silêncio.

- Ele vai chamar toda a sala do Rafael pra depoimento.

- Vai dar em alguma coisa? - Laysa tenta esboçar uma esperança.

- Vamos ver!

O pai de André os levou de volta às suas casas. Ele descia em todas e tinha uma breve conversa com os pais. A compreensão e colaboração veio de todos. Johnny subiu devagar as escadas. Não falou muito com os pais, apenas o que queria para o jantar. Tentava se sentir aliviado por desabafar com alguém. Obviamente temia a retaliação. O rosto de Gabriel vinha á sua cabeça repetidamente. Ele passou a noite em claro.

No dia seguinte, Johnny via uma viatura da polícia ao lado da escola.

- Para aqui, mãe!

- Mas a gente não chegou!

- Mãe, encosta!!

(Continua...)

domingo, 1 de março de 2009

INTITULADO -- PT. 4

André foi o primeiro a entrar.

- Sr. André Vieira?

- Sim, senhor!

- Você era amigo de Jorge Teixeira Lopes?!

- Sim, senhor! A gente sempre estudava junto. Ele me ajudava em lições de casa, provas e tudo mais...As notas mais altas da sala sempre eram dele!

- Seu pai disse que, no dia do crime, sua família foi jantar fora, você estava junto e apenas viu Jorge na escola. Correto?

- Correto, senhor!

- Tem idéia de quem possa ter feito isso?

- Ahm... - André fez uma pequena pausa - Eu me lembro de umas três vezes em que eu vi uns dois caras colando fotos no armário do Jorge.

- Que tipo de fotos?

- De pessoas nuas. Eles achavam que o Jorge era 'nerd', essas coisas...

- Sabe o nome desses 'caras'?

- Eu conheço um deles, Rafael Andrade, ele também colou umas fotos no meu armário. Teve um dia que ele arrombou o armário de um colega nosso e jogou lixo dentro. Lixo de banheiro, sabe?! Ele foi suspenso por uma semana...

- Sabe quem era o outro?!

- Não, não conhecia ele!

- Sabe quem mais poderia ter feito isso, ou alguém que já tenha incomodado seu amigo?

- Não, senhor!

- Tá certo, se preciarmos falar de novo, a gente te liga. Deixa seu telefone. Chama o próximo!!
André se levantou e foi à sala de espera.

- Quem vai agora?!

Laysa se levantou rapidamente.

- Eu vou! Tudo bem, Johnny?!

- Sem problema, vai lá! Boa Sorte!

- Obrigada!

Laysa entrou na sala devagarosamente, e sentou-se em frente ao delegado.

- Srta. Laysa de Souza Campos?

- Sim, senhor.

- Você era amiga de Jorge Teixeira Lopes?

- Eu conhecia ele há uns quatro anos. A gente tava na mesma sala esse tempo todo. A gente se ajudava em algumas matérias e os pais dele eram amigos dos meus. Frequentemente rolava uma carona, porque a gente morava perto. De vez em quando eu jantava na casa dele.

- Srta. me desculpe, mas preciso perguntar. Vocês já tiveram algum relacionamento?

- Não. A gente sempre valorizava a nossa amizade, e isso acima de tudo! Ano passado a gente conversou sobre isso, e chegamos num senso bem rápido.

- Aonde estava no dia do crime?

- Depois da escola, fui pra casa. Á noite, jantei na casa da minha avó, voltei pra casa umas onze e meia.

- De acordo com o seu amigo, um rapaz de nome Rafael Andrade - Laysa paralisou ao ouvir o nome - chegou a colar fotos obcenas no armário de Jorge e de mais alguns alunos. Você o conhecia? - O delegado precisava perguntar, mas tinha uma boa idéia acerca da resposta, pois viu bem a reação de Laysa.

- Conhecia...E também vi o que ele fez com o Jorge. Aquele muleque é tipo do cara que quer se fazer passar de forte, porque falta neurônio na cabeça - Laysa esboçou uma raiva - Teve um dia que ele ficou dando em cima de mim, mas bem canalha! Aquilo se repetiu por dois dias, até que os pais de Jorge vieram, a chamado dele, pra resolver...Foi muito legal da parte dele!

- Concordo! Algo mais a respeito desse Rafael?

- Sim, senhor! Esse caso começou quando o colega do Rafael veio com conversa pra cima de mim.

- Que tipo de conversa?

- Ele me chamou pra sair depois da escola. Quando eu falei que não, ele ameaçou contar pro Rafael um monte de coisa ruim e falsa a meu respeito. E ainda disse que iria expalhar pra escola toda.

- E depois?

- Quando os pais do Jorge vieram, ameaçaram ele de expulsão e processo legal se ele fizésse alguma coisa.

- Depois?

- Ele não fez nada, a não ser me chamar de patricinha, além de outras coisas, umas duas vezes. O Jorge me defendeu nas duas!

O delegado fez algumas anotações em sua folha. Sublinhou o nome 'Rafael Andrade', levantou-se da cadeira, pegou uma pasta do arquivo, e a pôs na mesa.

- Mais alguma coisa?!

- Não, senhor!

- Está dispensada. Se precisarmos falar de novo, a gente liga - Passou uma folha e uma caneta para Laysa - Deixa seu telefone.

Laysa anotou seu telefone de casa, celular e nome completo. Pegou sua bolsa e deixou a sala.

Chama o próximo! - O delegado chama de dentro da sala. Johnny tirou seu boné, deixou-o com
André e entrou na sala do delegado, logo após Laysa sair.

(Continua...)

INTITULADO -- PT. 3

A polícia chegou à escola ás 8:00AM, pontualmente, conforme combinado no telefonema. A escola era composta por um prédio de três andares aonde ficavam as salas e outro de dois andares e um sub-solo, aonde ficavam as demais instalações da escola como, a biblioteca, sala de computadores, laboratório de ciências, sala dos professores e cantina. Ao fundo, uma quadra poliesportiva. Na entrada do prédio das salas, quatro cartazes com fotos de Jorge e depoimentos de amigos e professores manifestavam seu apoio à família de Jorge, e sua solidariedade. Bruno e Gabriel assinaram nos cartazes, numa demonstração de luto por Jorge, Rafael passou direto e foi para a sala 3A, aonde estudava.

Ao término da aula, os três se dirigiram ao auditório, aonde a polícia fez uma breve introdução das investigações e pediu que toda e qualquer pessoa que conhecia Jorge, pelo mínimo que fosse, deveria prestar depoimento na delegacia. Disseram ainda que qualquer pista poderia ser fundamental para a solução do caso e que não haveria aula no dia seguinte. O delegado ainda pediu que todos se retirássem, exceto os colegas de sala de Jorge, seus professores e funcionários da escola. Todos receberam convite especial para depôr, especialmente os colegas de sala. Entre eles, André, Johnny e Laysa, chamaram o delegado após a reunião. Eles alegaram ser os amigos mais próximos de Jorge, o que de fato, eram. André ajudava e era ajudado por Jorge em lições de casa, Johnny jogava xadrez e pôker com Jorge nos intervalos e após as aulas, e também estudavam juntos, Laysa estudava com Jorge havia quatro anos, e se conheciam muito bem. Moravam em ruas próimas, por muitas vezes, os pais de Jorge levavam Laysa para casa e vice-versa. Os três disseram ao delegado que iriam comparecer à delegacia na manhã seguinte, ás 11:00AM, para o depoimento.

André, Johhny e Laysa foram a um shopping center próximo, a convite de Johnny. Passaram a tarde na praça de alimentação. Conversavam sobre o que dizer ao delegado, as lembranças que tinham ao lado de Jorge e quando e como ele os havia ajudado. Por cerca de três vezes, Laysa ameaçou um choro, levada pela carga emocional que sentia, sua tristeza em perder um amigo, sua saudade dele, e de todas as risadas que deram juntos. André e Johnny lhe ofereceram refrigerante, alguns lenços de papel e algumas palavras de conforto.

- Obrigada... - Laysa sabia da importância dos amigos em horas como essa - Vamos embora?!

- Vamos! - Johnny concordou de imediato - A gente se encontra na delegacia ou na frente da escola?!

- Na frente da escola, meu pai leva a gente pra lá, depois a gente volta de táxi. A delegacia não é longe daqui - André afirmou. Ele também sentiu pelo falecimento do colega, havia perdido a conta de quantos '9' e '10' tirara com o auxílio de Jorge.

Da mesma forma em que os três estavam reunidos, Bruno, Gabriel e Rafael estavam sentados numa mesa de bar, a dez quadras da escola.

- E aí?! - Questionou Bruno - Que a gente faz agora?!

- Nada! - Rafael respondeu em tom seco - A gente não faz nada! Fala que não sabia de nada, não vimos ninguém, nem menos ele no dia e pronto!

- Sei lá, cara - Bruno mostrava um sério arrependimento - Podem desconfiar se a gente não depôr.

- Desconfiar de quê, cara! Você acha que todo mundo vai depôr, menos a gente?! Se bobear, só a classe dele vai depôr, os professores e o cara da biblioteca. Daí a polícia não volta aqui e pronto!
Bruno não se convenceu totalmente da resposta de Rafael. Ele ainda se sentia responsável, ainda podia ver os olhos de Jorge ao se deitar, e ouvir suas súplicas no silêncio da noite. Não dormia desde a madrugada em que limpou o sangue de suas mãos. Ainda sentia o cheiro dos sacos e do vestiário.

O dia amanheceu nublado, não passava dos 20ºC. André chegou á escola com o pai, Johnny e Laysa dividiam uma garrafa de 600ml de Coca, e mais algumas lembranças. Entraram no carro do pai de André sem dizer muito e seguiram para a delegacia. Laysa quebrou o silêncio, ao dizer que mal conseguiu dormir, e relatou um telefonema para André no meio da madrugada. Andre confirmou, disse que também teve insônia, mas chegou a dormir umas duas horas. Os três pensavam em como começar a relatar suas histórias para a polícia. O carro parou numa vaga e os quatro desceram.

- Pode chamar! - Grita o delegado para seu assistente.

(Continua...)

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

INTITULADO -- PT. 2

Entre bolas, cones e colchonetes, um amontoado de sacos de lixo amarrados por um cinto de couro preto em forma de um corpo humano, com vários insetos, vermes e baratas rodeando-o, além de neutralizarem o poder de fala dos que lá estavam, cobriu o vestiário com um odor insuportável. Os cães não conseguíam se aproximar do armário, enquanto os policiais cobriam o nariz com toalhas de papel. Fazendo o mesmo, o pai e a irmã de Jorge. A mãe se retirou e foi ao campo, se pondo a rezar para que, por debaixo dos sacos, não estivésse o corpo de seu filho. A perícia foi chamada, o local foi reforçado pela segurança enviada pelos pais de Jorge e qualquer membro da imprensa seria proibido de se aproximar do local.

A família de Jorge não quis ver o que quer que os sacos cobríam, mas recebeu uma chamada da perícia quatro dias depois. De acordo com o laudo, era o corpo de um garoto, cuja idade, altura e peso eram compatíveis com o de Jorge. Eles foram chamados para fazer o reconhecimento. Todos foram.

Chegaram ao necrotério ás 10:00Am, conforme solicitado pela perícia.

- Por favor, sigam-me - Disse o cientista forense local, em tom neutro.

Os pais de Jorge foram dirigidos á sala 2046, na qual apenas uma maca fora montada, e um corpo coberto lá estava. O médico descobriu o rosto, pescoço e parte do tórax. A identificação foi positiva. Era Jorge. Estava com um corte profundo na testa, já putrefato, pele pálida, lábios azuis e secos, pescoço quebrado. Nada poderia tê-los preparado para tal brutalidade. A mãe de Jorge perdeu a força nas pernas, de tanto trêmulas que ficaram, caiu no chão e entrou num choro desesperador e angustiante. O pai tentou abraçá-la e contê-la, para que não saísse correndo.

O médico os olhou, pôs a mão no ombro do pai de Jorge.

- Eu sinto muito. - O tom era mais melancólico. Ele fora emocional e fortemente atingido pela imagem - Muito mesmo.

O pai de Jorge lhe agradeceu e se levantou, erguendo sua mulher. Izabella recebeu a notícia dos pais e entrou no mesmo estado de sua mãe. Os três foram levados a uma sala vaga, aonde os médicos lhes ofereceram café, água e rosas. A comissão do necrotério era reconhecida por dar grande valor e apoio às famílias dos falecidos.

Uma psicóloga designada pela comissão foi até a sala e conversou com a mãe de Jorge. Acompanhada pelo médico, seu assistente e um psiquiatra, eles passaram uma hora e meia conversando com Izabella e seus pais. O médico perguntou á família sobre o que desejariam para o corpo de Jorge. A decisão foi cremar o corpo, e construir um monumento no cemitério da Consolação, aonde ficarão as cinzas de Jorge. A polícia iniciou um inqueríto no dia seguinte, na escola de Jorge. Um telefonema para o diretor da escola e o consentimento dos pais. A casa de Jorge recebeu inúmeras visitas, cartas e telegramas de membros da escola, solidarizados com o fato.

(Continua...)

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

FRIDAY THE 13TH

A CASA 66

Nem mesmo o carteiro, aquele bom moço que costumava passar em todas as casas da rua Balthazar, era conhecido por todos os moradores da rua, sempre trazendo as correspondências esperadas e com suas boas dicas sobre como reduzir suas contas, minimizando aquela tradicional correria no início de cada mês, chegou a ter a ousadia de tocar a campainha da casa nº66, a última da rua. Ninguém sabia ao certo por quê, mas havia uma grande desconfiança sobre a casa. De todas as casas da rua, era a única cujo quintal não era lá dos mais bem cuidados, tão pouco a cerca da casa, e a própria. Exceto pelo telhado, que era constantemente reparado. Seus vizinhos mais próximos, a casa nº64, dos Alvez Diaz, alegam ter visto alguns casais adentrando na casa e saindo sem falar uma palavra.

Acima da porta da frente havia uma estaca, algo como uma mastro de uma bandeira, porém sem a própria. Na manhã de uma fria sexta-feira de julho, dia 13, a estaca amanheceu sendo sobreposta a uma bandeira negra, e um tapete vermelho ligava a caixa de correspondência á porta da frente. Ao meio-dia, a casa dos Alvez Diaz recebia a visita de amigos. Era o aniversário de um ano da casa. Eles não possuíam filhos, mas eram casados há 1 ano e meio, e há 1 ano exato, efetuaram a compra da casa. Todos arrumavam a casa para a festa que iria ocorrer naquela noite. Cada um deveria trazer alguma coisa.

20:13hs. A casa nº66 dava sinais de movimento. Havia várias luzes acesas, e uma movimentação nos fundos da casa. Três cães eram alimentados. A casa nº64, estava pronta para o início das festividades. Ás 21:13hs, os convidados chegaram.

22:00hs. Enquanto rolava a festa na 64, um casal amigo dos donos, Francisco e Mariana, fitava a casa 66 por uma das janelas, próxima á porta da frente.

- Você conhece seus vizinhos?!

- Já jantamos umas 3 vezes na casa 62, eles eram foram muito gentis. Na 65 já fui jogar pôquer, a última vez foi na semana passada.

- E na 66?

- Nunca falei com eles. O cara da 65 me disse que eles são sequestradores. Achei que fosse piada...

Francisco fechou levemente a porta da frente, e caminhou até a fachada da frente da casa 66. A luz do porão estava acesa. Ele toca a campainha.

Um velho senhor abre a porta.

- Quem é?!

- Oi... - Francisco não sabia bem o que falar - Ahm..., meu nome é Francisco Salto, eu sou amigo dos donos dessa casa...

Antes que terminásse, o senhor fechou a porta. A luz do porão continuava acesa.

- Que você tá fazendo aqui?! Marian o tomou de susto

- Ah, só queria ver se eles querem vir pra festa!

- Eu não gostei daqui, vamos embora, vem!

- Tá legal!

Enquanto caminhavam á porta, Francisco acendeu um cigarro. Mariana pegou outro do mesmo maço e acendeu-o. Após alguma tragadas e uma breve conversa jogada fora, ouvem passos rápidos. Um dos cães, um rottweiler aduto, surge do quintal da casa 66, pula a cerca e abocanha Mariana no pescoço. Ambos caem contra a porta. O casal tenta afastar o cão, quando este ataca Francisco. Mariana abre a porta procurando ajuda, ela já esta cambaleando, o Rottweiler abriu uma grande ferida em seu pescoço e sangue arterial saía esguichado, 'pintando' a parede. Todos na festa se dão conta da situação. Dois rapazes pegam uma cadeira cada e tentam atingir o Rottweiler. Quando um deles põe-se para o lado de fora, outro Rottweiler, ainda maior do que o primeiro, se juntou a este, e ambos estão devorando as tripas do jovem. Mariana cai no chão, sem vida, e sua trilha de sangue ocupa toda a entrada.

O segundo Rottweiler salta contra o rapaz, e ambos caem contra a porta, quebrando-a. Ao caírem no chão, um Pitbull se coloca ao seu lado e os dois páram por 10 segundos. Eles encaram as pessoas nos olhos, farejam seu medo e desespero, e atacam a garganta do rapaz caído sob o Rottweiler. O outro rapaz que pegou uma cadeira atirou-a contra uma das janelas, numa desesperada tentativa de fuga. O Pitbull corre e o derruba, repetindo o modus operandi de seu 'aliado', atacando a jugular do rapaz, depois desmembrou a perna direita do rapaz. O restante dos convidados subiu para o andar superior, entraram no quarto do casal e trancaram a porta. Os cães terminavam de devorar, um dos Rottweiler foi até a cozinha, o outro subiu na mesa de jantar e devorou tudo o que lá havia. O Pitbull foi até a porta da frente, e mandou uma seqüência de latidas que ecoou por toda a rua. A casa 62 acordou pelas latidas, e um jovem olhou pela janela.

O velho senhor saiu da casa 66 e foi ao encontro do Pitbull. Ele trajava um longo sobretudo preto. O cão farejou na escada e apontou com o focinho para o andar superior. O velho olhava a sala, os móveis desordenados, os cadáveres e o sangue ao chão, e os vizinhos, que não se atreveram a por o pé fora de casa e se limitaram a observar, em sua 'segurança', os acontecimentos na casa 64. O velho os fitou por um segundo, antes de subir ao andar superior. Os cães o seguiram. O velho olhou para o Pitbull e apontou para a porta do quarto do casal.

- Vai!

O cão obedeceu prontamente e arrombou a porta. As pessoas se amontoaram no canto oposto. O sr. Alvez Diaz tentou ficar á frente delas e encarar o velho, que apontou para ele.

- Não tente fazer isso de novo! - Fora tudo o que disse, antes de voltar à escada. Os cães voltaram a seguí-lo. No andar inferior, o velho pegou a perna que o Pitbull havia desmembrado e a levou até a sua casa, para que os cães a terminássem. Na casa 65, um casal se atreve a sair e iluminar a casa 66 com duas lanternas de longo alcance. Uma delas iluminou a face do velho, com sua grande cicatriz que cortava sua testa ao meio. As luzes se apagarm quando ele apontou para a casa 65, os cães se puseram ao seu lado.



- Vão!


FIM

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

INTITULADO -- PT. 1

O relógio já batia as dez horas da noite de quinta-feira. O apartamento número 1025, no décimo andar de um edifício na última quadra da rua Teixeira Lopes, se encontrava com todas as luzes acesas. Os telefones tocavam a todo momento. Na sala de estar, um casal se vê á beira da agonia, enquanto busca alguma pista sobre o desaparecimento de seu filho, Jorge, de 15 anos. Ele estava sumido desde o meio-dia, quando saiu da escola, mas não fora visto em nenhum lugar que freqüentava. Nem no clube, na bilioteca, na loja de CDs que sempre ia, na casa de algum de seus amigos mais próximos, nem na própria escola, aonde possivelmente voltaria para revisar o conteúdo das próximas aulas. As provas se aproximavam, e Jorge era um típico aluno, como se diz, "CDF".

Dez e meia. O telefone toca novamente na casa dos Teixeira. A mãe, trêmula nas mãos, atende. Um funcionário da escola havia ligado. De acordo com ele, Jorge foi visto deixando a escola acompanhado por três alunos da 8ª série. Ele os identificou como Rafael, Gabriel e Bruno.

A mãe de Jorge anotou os nomes dos alunos e solicitou seus números de telefone e suas classes. Durante a manhã de sexta, os três rapazes receberam telefonemas da mãe de Jorge. Com a voz já enfraquecida pela tensão e falta de sono, ela perguntou se eles sabiam aonde Jorge estava. Nenhum soube dizer, mas Bruno disse que o vira numa rua movimentada da cidade, próxima ao parque dos imigrantes, frequentado por pessoas que treinavam para provas de atletismo. A pista sempre estava com gente entrando e saindo, e o restante do parque na mesma situação. Os vendedores de bebidas e repositores energéticos quase não descansavam, especialmente nos finais de semana.

Os pais de Jorge passram a tarde no parque e nas proximidades. Munidos de fotos de Jorge, perguntavam a vendedores, seguranças e policiais se alguém havia visto seu filho. Com o consentimento e ciência da coordenação do parque, colocaram cartazes de 'procura-se' com a foto mais recente de Jorge que tinham. Nela, ele trajava uma camiseta azul-escuro e jeans. Jorge sempre teve o azul como sua cor em preferencial.

Domingo. 13:15. Aquele mesmo telefone tocou duas vezes, antes da irmã de Jorge, Izabella, atender. A pessoa não quis se identificar, mas deu detalhes do local no parque aonde ela viu Jorge na quinta. O recado foi entregue de imediato aos pais de Jorge, à direção da escola e à polícia. Ás 16:00 o local estava isolado e buscas eram feitas nele e em alguns locais próximos, identificados pela testemunha. Dois cães da polícia apontavam seus olhares para o vestiário masculino próximo á pista, aonde entraram dois policiais e os pais de Jorge. Os cães foram para o mesmo local, o armário de utensílios. Quando a porta se abriu, um silêncio tomou conta das seis pessoas presentes no local.

(Continua...)

domingo, 25 de janeiro de 2009

ENVIE -- CRÉDITOS

Autor:
Rodrigo Figliolini

Agradecimentos:
Johnny Will
Bel Elias
Candé Brandão
Rodrigo Nahas
Ian Felipe
Thamiris Dionízio
Dênis Dionízio
Bruno Cassab
André Xavier

ENVIE -- PT. 9

Philip não foi à escola no dia seguinte. Ele saiu de casa em seu horário normal de saída e foi ao shopping. Ele procurou se distanciar de tudo que pudésse lembrar o dia anterior, de todas as lembranças que guardaria consigo pelo resto de seus dias, de qualquer pingo de arrependimento que ele pudésse ter, mesmo achando impossível, e de qualquer coisa relacionada á sua escola. Ele fitava as vitrines das lojas, os cartazes de promoção, os vendedores bem e mal humorados, as famílias unidas para compras e as turmas indo ao cinema. Ele se sentia isolado daquilo tudo. Para ele, ele era apenas uma câmera observando o movimento dos transeuntes e reportar as anormalidades para o pessoal encarregado da segurança. Toda a sua tentativa foi em vão ao notar uma menina de visual semelhante ao de Mariana entrando numa loja de sapatos e, numa loja de eletrônicos próxima, um rapaz semelhante a Joseph saindo, com uma sacola na mão direita e acompanhando duas meninas. Ele andou depressa à escada mais próxima e ao subir, esfregou os olhos. Ele não chorava, mas tentava se desfazer da imagem.

Passou no McDonald's, comeu dois Big Macs e foi pra casa. Chegando, pegou um balde, depositou as roupas que estavam sob a cama, foi aos fundos da casa e ateou fogo nas roupas. Ali, era o momento de queimar as lembranças e sair de lá renovado. Ele se concentrou no carro de seu pai e, na esperança dele ser seu quando o pai comprar outro, algumas lembranças foram diminuídas. Quando viu que material suficiente fora carbonizado, ele usou a mangueira de regar para apagar o fogo e sacos de lixo para recolher o que sobrara e jogar fora. Como precaução, lavou o balde três vezes. As facas foram junto, enroladas em papel alumínio, o facão foi depositado num bueiro de rua horas depois.

Na manhã seguinte, ele foi à escola no horário, chegando, limitou-se a não se expressar muito, até que um momento lhe surpreendeu. Ele notou quatro cartazes com as fotos de Mariana e Joseph no corredor das salas, e dez cartolinas com assinaturas de alunos, professores e funcionários da escola pedindo a localização do assassino. Um colega de sala abordou Philip, e após perguntar por que faltara no dia anterior, comentou que a polícia esteve lá, para pegar depoimentos do corpo docente e discente da escola, para verificar se alguém era suspeito. Ao lado da porta da sala da Joseph, uma folha A3 contendo uma oração feita pelos alunos homenageando Joseph com uma foto dele em cima. Philip chorou naquele momento. Pôs a mão sobre a folha, e foi amparado por um professor de física que entrava para lecionar. O professor disse algumas palavras de consolo e demonstrou seus sentimentos pois sabia que ambos eram amigos, depois disse que a escola faria uma palestra para homenagear Joseph e Mariana no auditório após a aula, e que a escola não iria abrir nos próximos três dias de aula.

Philip enxugou as lágrimas e entrou em sua sala.

Após a aula, todos os alunos se dirigiam ao auditório para a palestra, e Philip foi ao banheiro. Ao entrar, viu o armário de utensílios de limpeza semi-aberto. Dentro, havia vários produtos de limpeza. Ele pegou um frasco e pôs na mochila.

No auditório, fotos de Joseph e Mariana num mural posto no palco, um palanque com microfone, duas cadeiras e uma caixa de som com duas velas e um castiçal em cima. Na primeira fila, os amigos mais próximos de Mariana e Joseph, na segunda, os membros da diretoria. O restante da escola ocupou as demais fileiras. O diretor entrou pela portão, subiu ao palco e se postou no palanque. Com umas folhas de papel, ele fez um discurso para homenagear os alunos, citou a feira, na qual Joseph fora campeão, e a matéria de História, na qual Mariana apresentou um trabalho que tirou a maior nota. Ele demonstrou as expectativas que tinha nos dois alunos e expressou seus sentimentos aos pais de Mariana e Joseph, os quais foram os próximos a falar no palco. A mão de Mariana, muito semelhante á filha, levou uma foto das duas juntas numa viagem e, tentando conter o choro para falar, agradeceu o apoio da escola no momento. Philip assistia a tudo da terceira fila. Ele se sentia num julgamento. E foi convidado a falar.

Ele andou devagar ao palanque, vendo as fotos, os olhares na platéia, e foi cumprimentar os pais de Mariana e Joseph. Ele conseguia sentir o sangue de suas vítimas e todas as lembranças voltaram como uma bomba ao olhar nos olhos dos pais, tornando a tentativa do balde impossível e fracassada. O pai de Joseph abraçou Philip e lembrou de uma noite em que Philip jantou em sua casa, após a execução de um trabalho de Português.

Philip subiu ao palanque e ajustou o microfone á sua altura.

- Boa Tarde a todos. - Uma pequena pausa - Joseph era um amigo muito próximo de mim. Sempre nos reuníamos quando possível para falar da vida, de trabalhos, tudo para preservar e fortalecer a amizade que tínhamos. Foi uma pessoa que me ajudou muito. Ajudou a me conhecer e a melhorar em alguns pontos. Com a Mariana eu tive menos contato, mas ainda assim, eu conhecia um pouco dela. Tivemos uma boa renuião juntos e uma vez fomos ao cinema com outros amigos. Era um bom tempo. Uma pena que ele se foi, mas assim é a vida. E temos que aceitar algumas coisas que infelizmente acontecem com a gente, e espero que aceitemos essa.

Ele tirou o frasco da mochila e leu 'Cuidado, leia com atenção as instruções de uso' e 'Mortal se ingerido'.

- Espero que aceitem isso. Eu vi Mariana e Joseph pouco depois que morreram. Na verdade, eu fui o último que os vi com vida, porque fui eu que matei eles!! E, se quiserem, eu dou todos os detalhes a vocês e à polícia. Ainda não sei se estou arrependido do que eu fiz, mas eu quis pegar de volta o que tiraram de mim. Agora vou me explicar. Adeus!

Abriu o frasco e bebeu tudo o que havia dentro. Era um desentupidor de canos, altamente tóxico. Em 30 segundos, Philip caiu no palco, teve um sufocamento causado pelo líquido tóxico, seguido de tremores. Ele parou de tremer e seu corpo parou de se contrair, relaxando totalmente e Philip fazendo uma expressão neutra. Estava morto.

Todos os presentes mal puderam expressar-se diante de tal cena, apenas a mãe de Mariana, que entrou em choque e desmaiou após a declaração. Um segurança pediu uma ambulância e chamou a polícia, para reportar o que Philip dissera. Outro segurança impediu que qualquer pessoa se aproximásse do corpo de Philip. O pai de Joseph se aproximou até onde podia e olhou os olhos de Philip. Segurando uma maleta e um lenço, ele os apertou tão forte ao ponto de quebrar a alça e rasgar o lenço. O pai de Mariana foi ao lado dele, estava no mesmo estado, ambos olhavam para Philip, a última pessoa que imaginavam ter matado seu filho.

FIM

ENVIE -- PT. 8

Philip estava prestes a engatar a marcha-a-ré para atropelar novamente, mas seu instinto o ordenou fazer outra coisa. Ele tirou um boné do banco de trás e o pôs na cabeça. Seguidamente pegou a mochila e saiu do carro. Joseph pouco se movia, já sangrava muito. A trilha de sangue, principalmente saída de seu quadril, já chegava ao bueiro. A porta do carro se abriu vagarosamente, enquanto Philip colocava as pernas para fora. Mariana chorava desesperadamente, e á medida que Philip se aproximava dela, o desespero crescia. Ela não se pôs a correr, pois observava o estado de Joseph e se agachou para tentar ajudá-lo, mas ele já se encontrava inconsciente e quase morto.

Philip tirou o facão da mochila e a pôs nas costas. Quando Mariana ameaçou correr, ele a segurou pelo ombro direito.

- Por favor, não me mate!! Por favor!!!!! - Ela implorava.

- Fica quietinha aí!

- Phi-Philip?!!! - Ela mal acreditava que era ele o autor. O boné cobria seu rosto.

Mariana entrou em choque quando Philip tirou o boné e se revelou. Ela levou as mãos ao rosto e, chorando ainda mais, perguntou por quê ele atropelou Joseph.

- Foi por sua causa. E não ouse me dizer o contrário!

- Mas...

- Cala essa boca - Philip ameaçou, colocando o facão contra o pescoço de Mariana.

Paulatinamente, Philip fez Mariana ajoelhar-se no chão, próxima ao corpo de Joseph, já morto. Ele se agachou e aproximou seu rosto do ouvido de Mariana, segurando-a pelo braço enquanto ela tentava resistir.

- Eu sempre te amei. Leve essa marca com você.

Philip fez um corte longo e profundo no pescoço de Mariana. Assim que viu o sangue escorrendo pela blusa, ele a golpeou novamente, na barriga, com força suficiente para o facão atravessar o corpo. Ele quase chorava ao golpeá-la, ao pensar que tudo poderia ter ocorrido de outra forma, mas se conteu.

Ao tirar o facão de Mariana, ele se levantou e observou Mariana dar os seus últimos suspiros. Por alguns segundos ele se virou para pôr o facão de volta na mochila e ver se havia outras pessoas por perto. Naquele momento cada lembrança que Philip tinha de Mariana veio á tona. Ele conseguiu sair com ela quatro vezes. Uma para ir ao cinema, duas após festas do colegial, quando foram tomar sorvete e uma no restaurante japonês perto da escola. Lá, ele tentou se expressar para Mariana, ele acreditava que era a oportunidade perfeita. Adorava apreciar o cabelo ruivo de Mariana e as sardas que ela tinha abaixo dos olhos. Philip enxugou uma única lágrima que lhe escorreu enquanto olhava para os corpos de Mariana e Joseph, ambos sem vida, e a trilha formada pelo misturado deles desenbocando no bueiro. Ali, muitas coisas entravam junto com o sangue, de acordo com Philip.

Ele correu para o carro e saiu de lá fritando os pneus. Parou num beco a dez quadras de sua casa, pôs o boné de volta na cabeça, a mochila nas costas e foi correndo para a garagem de sua casa, aonde esvaziou a garrafa de Whisky que abrira e subiu para o quarto, desta vez, com a maior lentidão que jamais teve. Ao subir as escadas, tirou o boné e a camiseta. Assim que sentou-se na ponta da cama, tirou o restante das roupas e as colocou sob a cama. Ainda não sabia o que fazer com elas. Ele não parava de olhar para o chão e pensar em tudo o que fez. Ele não se sentia arrependido, mas amargurado. Aquilo aconteceu com a garota na qual ele investiu tempo, esforços e dinheiro, mas obtivera muito pouco retorno. Seguiu para o banheiro aonde tomou uma ducha longa e, em parte, gelada.

(Continua...)

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

ENVIE -- PT. 7

Mariana se despediu e saiu sem falar muito. A presença de Philip não lhe agradava muito. Ele limitou-se a observar a saída de Mariana e voltar seus olhares para a sala. Tirou a mochila das costas e se preparava para entrar. Deu apenas 2 passos em direção á porta, mas parou subitamente. Ele sabia que estava prestes a cometer algo impensável, mas pensou nas sirenes da polícia, em algemas em seus pulsos, péssimos companheiros de cela, dentre outras coisas. Após ouvir da diretoria que as chances da bolsa ir parar nas mãos de Joseph eram grandes, ele quase entrou na sala de solavanco. Ele estava ainda mais irritado, mas fechou a porta e saiu. A sala da diretoria não era maior do que o banheiro, era possível ouvir o que se falava. A secretária apenas reparou a presença de Philip, mas não lhe indagou nada.

Assim que o sinal tocou a saída, Philip foi à sala de Joseph perguntar como foi na reunião. Joseph contou a notícia da bolsa, e confirmou a participação na feira estadual.

- Aonde vai ser?

- Em Santo André - Aquilo, para Philip, foi a gota - Tenho 1 mês para me preparar, os diretores vão me mandar todas as instruções por e-mail amanhã.

E Philip ainda teria outra bomba em sua consciência. Ao informar que Mariana passou para vê-lo, Joseph disse que ela o convidou para jantar em sua casa, para, segundo ela, discutir o projeto.

Enquanto andavam pelo corredor, Mariana se aproximava. Philip se sentia 'sobrando' na área. Mariana cumprimentou ambos, e foi tudo o que ela disse à Philip. Ele só ficou ouvindo o combinado entre Joseph e Mariana. Eles iriam almoçar juntos, depois iriam para a casa de Mariana. Aparentemente, o jantar foi puxado para a tarde toda.

Philip saiu á francesa, andando até o fim do corredor, seguidamente correu para a saída, voltando a andar no portão, para não chamar a atenção dos seguranças.

Havia três restaurantes próximos á escola. Dois deles serviam almoço, o outro era de cozinha japonesa. Philip sabia da preferência dos colegas á gastronomia oriental. Ele se sentou num dos bares perto da escola, de onde observou a saída de Mariana e Joseph. Ele sabia aonde ambos moravam. Como Philip imaginava, eles foram ao restaurante japonês.

Não demorou para o almoço se tornar mais do que casual, e Joseph fazia carícias em Mariana, chegando ao ponto de se beijarem, e darem risadas. Philip se sentia abandonado. Depois de ver a cena, ele só rezava para não estarem falando mal dele, depois, não se importou.

Ele saiu correndo para sua casa como se fugisse de alguma coisa. Apenas parava nos cruzamentos. Assim que chegou em casa se pôs embaixo do chuveiro e, mesmo de roupa, o abriu, na posição 'desligado'. Suas lágrimas enraivecidas se misturavam com a água fria que sobre ele caía. Não havia mais ninguém em casa.

Saiu, ligou o som no último volume e deitou-se na cama.

Quando desceu, de roupa trocada, pegou sua mochila e voltou á rua. Descendo a avenida, chegou ao término, aonde havia três carros estacionados, um terreno vazio e um prédio de quatro andares. Utilizando duas pedras encontradas no chão, quebrou uma das janelas do último carro, tirou os cacos com o casaco para não deixar á mostra, deu a partida e seguiu. Ao se aproximar do restaurante, Joseph e Mariana não estavam lá. Ele seguiu pelo caminho que fazia para a casa de Mariana.

Viu os dois andando numa rua pouco movimentada, a cinco quadras da casa dela. Estavam de mãos dadas, vez por outra um beijo acontecia. Philip seguiu de perto. Quando Joseph atravessava a rua, seguido por Mariana, Philip pisou no acelerador como se seu pé pesásse 1 tonelada. Joseph subiu 2 metros, antes de chocar-se contra o chão. Sua perna direita se desmembrou de seu corpo.

(Continua...)

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

ENVIE -- PT. 6

Joseph abordou Philip ao lado da porta.

- Só queria falar 'boa sorte'.

- Valeu, cara!!

Philip esperou Joseph entrar na sala. Quando deu uma leve olhada ao corredor, viu Mariana olhando para a diretoria. Chamou-a num grito breve.

- Fala! - Ela respondeu inocentemente.

- Vc tava falando com o Joseph?!

- É! Sobre o projeto dele! - Mariana entendeu a pergunta. Ela captava as investidas de Philip, mas negava todas.

- Vocês estão combinando alguma coisa?! - Philip foi direto ao ponto.

- A gente vai se ver nesse fim-de-semana pra falar dele.

(Continua...)

ENVIE -- PT. 5

Na hora do intervalo, Philip saiu da sala, apenas com o dinheiro do rango, mas desistiu ao ver o tamanho da fila. Ele optou por voltar à sala e rever o material da aula de História. Haveria uma prova naquela semana, envolvendo a história do Brasil durante a ditadura e o período de abertura do governo. Ele preferiu se concentrar no estudo. O alto nervosismo causado pela feira haveria de passar na cabeça dele. Enquanto arrumava seus materiais, Joseph entrou na sala. Philip pensou que nada do que ocorrera era culpa do amigo, não haveria por que tratá-lo mal. Conversaram numa boa, até o momento em que Joseph citou a reunião com a diretoria, e apresentou um certificado emitido por ela ao 'campeão' da feira. Aquilo reativou o rancor em Philip, que lutou bravamente para não demonstrar aquilo, o que ficou ainda mais tenso quando Joseph disse que uma colega dele o havia procurado sobre a feira. Porém, o assunto da feira era apenas um pretexto. Philip perguntou o nome dela.

- Mariana Guilhermo, a ruiva da minha sala, sabe quem é?!

Philip quase enfiou uma porrada nos dentes do colega. Ele era um pretendente de tempos de Mariana, nos meses anteriores, uma sucessão de investidas á moça. Philip imaginava que recebia um 'feedback' de Mariana. Naquele momento, ele se sentia menor do que a própria mesa.

Philip desconversou e saiu andando, decidiu matar a próxima aula e foi até a cantina, de onde furtou três facas e um facão de cortar carne. Escondeu tudo na mochila. De lá também furtou um suco de maçã, dois de melão e dois copos descartáveis. Correu ao banheiro para evitar os serventes da escola e misturou os sucos dentro de um dos copos, dentro do box.

O sinal tocava a última aula. Philip ainda estava no banheiro, do que sobrou dos dois sucos, ele bebeu tudo. Dixou tudo num box e foi lavar o rosto. A vontade dele era de arrancar uma das privadas e jogar contra o espelho. Ele queria ver qualquer coisa, menos o seu rosto, e sua expressão de derrota.

Quando o sinal tocou o fim da última aula, Philip bebeu boa parte da mistura e jogou um parcela em sua camiseta. Lavou os copos e escondeu na mochila.

Assim que saiu, um servente o abordou, perguntando por que não foi a aula. Philip disse que não passava bem, e que precisava ir ao banheiro. Acabou por vomitar o que havia comido antes.

- É melhor você ir pra enfermaria! Eu te acompanho!

- Não precisa, obrigado! Já estou melhor!

Philip já queria fugir do servente, mas este o pegou pelo braço.

- Tem certeza?!

- Tenho, sim!

Philip esperou por cerca de 15 minutos, próximo á diretoria.

(Continua...)

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

ENVIE -- PT. 4

Philip quase bateu o telefone na cara de Joseph. Ele mal acreditava no desabamento que lhe ocorrera, e como se não bastásse, ainda caem cacos de vidro nos seus olhos. Ele desceu à garagem, pegou uma garrafa de Whisky do seu pai, abriu e começou a beber. Ele fitou a pequena janela por quase uma hora. Nesse tempo, as palavras de Joseph repetiam na sua cabeça, de novo e de novo.

- Tá na mesa, Philip! - Sua mãe chama

- Já vou!

Philip fechou a garrafa e a colocou atrás do carro. Foi nessa hora que ele percebeu que havia bebido quase a metade da garrafa, o que o deixou levemente desorientado. Passou no banheiro para se recompôr, antes de sentar-se á mesa.

Ele mal trocou palavras com seus pais durante o jantar, tentou disfarçar ao máximo a sua decepção. Esta, aos poucos, se transformava numa inveja crescente de Joseph, cada vez que as palavras dele se repetiam. Philip se imaginava na feira estadual, em São Bernardo ou Santo André, e celebrando com mestres de faculdade. Ao perceber que tudo aquilo não iria lhe ocorrer, a não ser que houvésse uma súbita mudança nos fatos, ele sentia-se cada vez mais desconfortável sob sua pele.

No dia seguinte, Philip não conversou ninguém até chegar à sua sala. Apenas respondia a quem lhe cumprimentava, para não aparentar problemas.

(Continua...)

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A banca limitou-se a dizer que o projeto de Philip custaria muito ao governo para implantá-lo, o que o tornaria inviável para campanhas a curto prazo. Era ano de eleição para prefeito e vereador.

Philip evitou conversa com quaisquer pessoas mais que lhe aparecessem no caminho. Ele apenas juntou seu trabalho, pos numa caixa e saiu pela porta. Tudo o que deu tempo de ver foi os professores conversando com Joseph, elogiando-o por seu trabalho. Aquilo fez Philip parar por um minuto, antes de sair pela porta. Ele não quis jogar seu trabalho fora, apenas guardou-o na garagem, antes de subir ao quarto e lamentar-se como criança.

Na terça-feira, Philip não foi à escola. Ele não queria ver olhares de reprovação caindo sobre ele. Ele foi ao parque e decidiu pensar no que aconteceu. Lhe ocorreu por duas vezes conversar novamente com a banca, mas ele desistiu em ambas. Voltou para casa na hora do almoço, sua empregada terminava de fazer panquecas.

- Quero duas, por favor.

- O que vai beber?!

- Coca.

Foi tudo o que saiu da boca de Philip durante todo o dia. Até ás 8 da noite, quando seu celular tocou. Era Joseph.

- O que aconteceu? Você faltou hoje!

- É! Tive um problema em casa... - Philip se limitou a falar disso.

- Ontem, depois da feira, o Jean, da coordenação veio falar comigo! Ele me disse que a diretoria planeja indicar alguém da escola para a feira estadual, e uma bolsa de estudos! Eles querem me ver amanhã, na diretoria, depois da aula! Não é irado?!!! - Joseph não continha sua empolgação, Philip continha tudo o que lhe vinha á cabeça.

(Continua...)